Foto de Ricardo Stuckert - todos os direitos reservados( by Instagram de Chico Buarque)

No Palácio de Queluz Chico Buarque demonstra que a arte vence a estupidez

Ao acompanhar todas as notícias sobre Chico Buarque recebendo em Portugal o Prêmio Camões senti muito orgulho de ser brasileira.

As palavras elegantes de Chico, repletas de poética da vida, agradecendo ao Neanderthal desvairado por não sujar o seu diploma com uma assinatura, foram mais fortes que uma arminha apontada para o tal gajo. Chico Buarque foi voz de todos os brasileiros que amam a arte e cultura.

Colocou no devido lugar um troglodita que se elegeu disseminando falsidade ideológica, devastou o país por um desgoverno na pandemia e quase aniquilou  a essência da alma artística do brasileiro.  Mais feliz fiquei, sobretudo, por estar em Portugal e sentir a energia da vitória de perto, e saber que o presidente Luís Inácio Lula da Silva assinou e participou da cerimônia. 

Dois guerreiros, um da música e outro da política, sendo recebidos em Portugal, um país que acolhe muitos brasileiros, assim como muitos brasileiros simpáticos ao ex-presidente que não sujou o prêmio de Chico com sua assinatura. Esses, por sua vez, abominaram o sucesso da cerimônia porque vivem equivocados e “de-formados pelo Whatssap fakenews School e alienados na bolha.

Tudo isso ficou pequeno diante do simbolismo da cerimônia que para nós brasileiros (as, es), representou fortalecimento do papel da arte como meio de transformação social. A ministra da Cultura Margareth Menezes  cantora, artista, ativista, falou que a entrega do Prêmio Camões de 2019 a Chico Buarque simboliza o regresso da democracia no Brasil. Para quem desconhece a triste história, o ex-presidente negou-se a assinar o diploma de premiação de Chico pelas posições políticas defendidas pelo cantor e compositor brasileiro.

As músicas de Chico Buarque embalaram a minha juventude e até hoje são cantadas em prosa e verso pelas novas gerações. Um gênio que representou bem o espírito de um tempo – o zeitgeist. Suas músicas são elaboradas, poesias cantadas cheias de significados, arrebatadoras, apaixonadas, denúncias sociais de um tempo de repressão.Sua incrível habilidade com as palavras também abre margens para diferentes interpretações.

Um exemplo é a música Apesar de Você, que é repleta de ambiguidades e composta em plena ditadura militar no Brasil- 1970. O que parece ser um desabafo amoroso é na verdade mais uma crítica à ditadura militar. Quando os militares perceberam isso, censuraram a canção, invadiram a sua gravadora e destruíram as cópias do disco.

Hoje você é quem mandaFalou, ‘tá faladoNão tem discussão, nãoA minha gente hoje anda falando de ladoE olhando pro chão, viuVocê que inventou esse estadoE inventou de inventarToda a escuridãoVocê que inventou o pecadoEsqueceu-se de inventarO perdão

 

Para completar o brilho da cerimônia, o evento foi realizado no Palácio de Queluz,  no qual viveu o Imperador, D. Pedro I, depois que deixou o Brasil até os seus últimos dias, como também é considerado a Versalhes portuguesa, construído em 1794 pelo futuro D.Pedro III, casado com a rainha D. Maria I.  

 

 

Chico Buarque, portanto, esperou quatro anos para receber merecidamente  o Prêmio Camões, importante prêmio atribuído a autores e artistas que contribuem para enriquecimento literário e cultural da Língua Portuguesa, e o recebeu em alto estilo europeu. 

Palácio de Queluz foi moradia de verão dos reis portugueses na segunda metade do século XVIII. Está localizado entre Lisboa e Sintra e possui uma arquitetura rococó e neoclássica com extensos jardins nos moldes de Versalhes e áreas de lazer  que eram utilizadas pela família real para entretenimento em temporadas de veraneio. Atualmente o palácio transformou-se em museu e é aberto para visitação pública. Em 2019, tive o prazer de visitá-lo e apreciar sua arquitetura, fazer uma imersão na história portuguesa, inclusive o quarto no qual D.Pedro I viveu seus últimos dias, dos 32 anos vividos intensamente.

Nos jardins, a decoração é marcada por diversos grupos escultóricos que evocam a mitologia clássica, de que se destacam as estátuas em chumbo do atelier londrino de John Cheere.

 

O palácio foi habitado em permanência até a  partida da Família Real para o Brasil, quando inicia as invasões francesas, em 1807, um dia antes da entrada das tropas napoleónicas em Lisboa, sob o comando do general Junot. 

Em 1821, D. João VI regressa a Portugal, mas o palácio só volta a ser habitado, em regime de semiexílio, pela rainha D. Carlota Joaquina, acusada de conspirar contra o marido. Todavia, os tempos áureos das alegres celebrações não mais voltariam a animar aquele espaço.

 

Apesar de vocêAmanhã há de ser outro diaEu pergunto a você onde vai se esconderDa enorme euforiaComo vai proibirQuando o galo insistirEm cantarÁgua nova brotandoE a gente se amando sem parar

 

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Que falta de cultura apagar uma obra do Kobra. É ou não é para chorar?

Totalmente! Não somente falta de cultura como a mais extrema truculência e até mesmo, o exemplo do que é ser tosco e não perceber a preciosidade de uma obra de arte que além de ser testemunha de um tempo, era vida e vibração para o local.

Eduardo Kobra é um artista- muralista- brasileiro de renome internacional. 

Kobra foi autor do mural das Etnias, no Rio de Janeiro, feito para as Olimpíadas de 2016 e entrou para Guiness pelo tamanho – 2.600 metros. “Esse recorde para mim não se trata do maior mural do mundo, se trata da maior pintura pela paz entre as nações”, afirmou ele, numa entrevista.

Seus murais inspirados e coloridos estão espalhados pelo mundo afora. Os temas são sobre a vida e seus traços e cores são inigualáveis. O mural apagado fazia parte da série Muros da Memória e representava São Paulo na primeira metade do século 20.

Segundo matéria publicada nos jornais, os proprietários do imóvel justificam que nunca deram autorização para que o grafite fosse feito e que o muro será derrubado para construir um estabelecimento comercial.

 

Foto: Reprodução/Instagram Eduardo Kobra

Que falta de bom senso! 

É um atestado de pura ignorância não aproveitar um trabalho artístico como o do Kobra para fazer marketing do local, ainda mais com a ideia de construir um estabelecimento comercial. Teríamos nesse caso um universo infinito de ideias criativas. Que barbárie cometida pelos pobres de espírito!

 A capital paulista, cosmopolita, das bienais inovadoras e polêmicas, que foi palco de tantos movimentos de vanguarda nas artes,  está uma lástima, um verdadeiro desastre no trato das questões sobre arte de rua nos últimos anos. Desde o Dória, São Paulo vem cancelando sua identidade nas ruas e substituindo o colorido dos grafites e a inquietude do que foi pichado pelo vazio do branco e do cinza. Esse marasmo aliado a poluição.

Quer saber mais sobre grafite, pixo e pichação leia nosso artigo: Pixo é engajado, pichar é chique e o grafite é imagem

Amesterdã, Holanda

Let Me Be Myself (Deixe-me ser eu mesma) é uma homenagem a uma das mais famosas vítimas do holocausto. Anne Frank

Foto: Reprodução/Instagram Eduardo Kobra

Moscou, Rússia.

Inspirado na imagem de uma bailarina, Maya Plisetskaia, que encontrou no Centro de Documentação do Bolshoi, Kobra fez, em 2013, esse mural está entre os mais famosos. A bailarina morreu em 2015 e hoje o espaço é ponto de homenagem a ela.

Foto: Antoneko Maria/Shutterstock

Rio  de Janeiro, Brasil

Localizado na região da Zona Portuária do Rio de Janeiro, o mural Todos Somos Um foi inaugurado em 2016 , por ocasião das Olimpíadas realizadas no Brasil. No trabalho, inspirado na mensagem de união, Kobra pintou os representantes de cinco tribos, cada um de um continente.

Foto: Shutterstock

Enquanto no Brasil os incultos passam a borracha nas obras de artes dos seus grandes artistas, em Londres, um grafite de Banksy foi removido de um muro em 2013 para ser levada a leilão e a arrecadação ser direcionada a uma obra de caridade, e os moradores de Tottenham (bairro de onde foi retirada a obra) protestaram indignados. 

Leia sobre Banksy nesse artigo do Pan-HoramArte: Banksy o vândalo genial que não se revela

 

É não é para chorar? Falta cultura em gente que apaga um mural do Kobra e o substitui por um muro branco e vazio.

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Aí que dó dessa água! Quando vamos parar de consumir tanto plástico?

É urgente repensar a relação da sociedade com o plástico! As imagens de um rio ou mar poluídos com embalagens plásticas são chocantes. Será possível que não aflige o teu coração essa agressão sem limites?

As duas fotos que ilustram esse início de texto foram desanexadas da instalação vídeográfica do artista e arquiteto Asif Khan, cuja obra faz parte da mostra Plástico: Reconstruir nosso mundo, em exibição no MAAT, em Lisboa. A instalação chama-se Kalpa – palavra em sânscrito que designa um período geológico na cosmologia hindu e budista, compreendendo a criação, distribuição e recriação do mundo.  

O vídeo tem 9 minutos e faz o visitante participar de uma viagem através do tempo, desde o surgimento de formas microscópicas nos oceanos da Terra até à sua contínua acumulação e transformação sob o fundo do mar, e a descoberta do petróleo dois milhões de anos depois. Na metade do filme mostra  a presença dos produtos e resíduos plásticos e também a contaminação dos ecossistemas marinhos resultante da sua decomposição em microplásticos

A exposição analisa o material revolucionário e profundamente controverso a que atribuímos o nome genérico de “plástico”, mas que, na verdade, inclui um universo de produtos sintéticos, com características e utilizações diferentes.  

Calcula-se que 8,3 milhões de toneladas de plástico foram produzidos no mundo desde o início do século XX e desse total apenas 9% foram efetivamente reciclados. 

São três tipos de reciclagem, mecânica, química e biológica. O maior desafio da reciclagem é a separação e triagem dos diferentes tipos de plásticos e o fato de se tratar de um processo que muitas vezes se limita a reconverter os resíduos em produtos de menor valor e adiar a inevitável incineração ou deposição em aterro.

 

Outro vídeo interessante da mostra é divulgado pela DW – Deutsche Welle – imprensa alemã, no qual mostra a rotina de um funcionário recém contratado por uma empresa de reciclagem. Apenas um pequeno trecho do material audiovisual, porém já é capaz de produzir um impacto muito grande sobre nosso julgamento em relação ao consumo exagerado do plástico. As imagens refletem o consumo somente na Alemanha e onde o trabalho de reciclagem é feito com o apoio da mais avançada tecnologia. E o resto do mundo, sobretudo o terceiro mundo onde a tecnologia ainda não chegou? A destinação com certeza a pior possível.

 

imagem gráfica da exposição "Plástico: Reconstruir o Nosso Mundo". © Vitra Design Museum, ilustração: Daniel Streat, Visual Fields

Dividida em três secções, a exposição abre com a instalação videográfica sobre a relação geológica fundamental entre plástico e natureza. A segunda secção percorre a história do plástico desde a sua origem natural até à experimentação com materiais sintéticos de meados do século XIX e início do século XX, prosseguindo depois com o crescimento da indústria petroquímica, o seu impacto na escala de produção do plástico e a crescente preocupação com o planeta a partir de finais do século XX. Por fim, a terceira secção faz um balanço dos atuais esforços para repensar o plástico, desenvolver alternativas, reduzir a sua produção e consumo e promover a sua reutilização.

 

Uma mostra extraordinária como meio de conscientização sobre o problema do consumo e destinação do plástico. Infelizmente ou felizmente o produto já está anexado à vida quotidiana e sua total retirada é impossível, sobretudo em peças de maquinários e outras funções. Não tem mais volta a sua eliminação nos processos que o envolvem, seja na indústria, nos materiais e objetos de consumo. 

O maior desafio no caso do consumo do plástico é a separação e triagem dos diferentes materiais. O que significa isso? 

Significa que depende de nossas ações individuais, cada um fazendo a sua parte ao separar com seriedade os lixo e o material reciclável. Vamos lá minha gente reconstruir nosso mundo, purificar nossa água e proteger a natureza!

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Valeu a luta EGC! MinC voltou para potencializar a identidade brasileira

Vibramos juntos na alegria de Janja e Margareth Menezes e dos funcionários do Ministério da Cultura ao colocarem o letreiro identificando o MinC na Esplanada dos ministérios.

Cerimônia tão elementar e simples, porém tão significativa para quem lutou pela retomada da instituição cultural no Brasil. É gratificante!

Há dois anos, precisamente em agosto de 2020, em plena pandemia, não suportando mais o desmonte cultural no país por um desgoverno genocida; artistas, intelectuais e profissionais de todas as artes, liderados pelo cineasta Silvio Tendler criaram os Estados Gerais da Cultura, num encontro virtual. O EGC ganhou logomarca espaço nas redes sociais e um canal no Youtube para provocar e promover o debate.

Durante quase dois  anos estivemos confinados em casa, mas nossa voz ecoava pelo mundo afora em encontros com representantes das ciências, da política, das artes, das minorias. Caminhamos ao lado do movimento SOS Cultura liderado pela Associação de Funcionários do MinC. 

 Todo o tempo estivemos presente nas redes sociais com manifestos, denunciando absurdos cometidos durante um governo que politizou a pandemia, desrespeitou a ciência, militarizou escolas e tentou sufocar nossa cultura. 

A história universal comprova que um povo sem cultura é como marionetes nas mãos de ditadores. Por isso, a primeira medida de opressor sobre o oprimido é destruir a sua identidade cultural. Tentaram mas não conseguiram. 

Tentaram destruir a essência da alma brasileira e ela está mais viva do que nunca e presente nas ações do reconstruído Ministério da Cultura.

O verbo esperançar está sendo conjugado a todo momento com ações de fomento à cultura. Em poucos meses foram retomados os principais programas que estavam sufocados numa gaveta bolorenta do Ministério do Turismo durante quatro anos.  Um novo decreto assinado no dia 23 de março pelo presidente Lula e a ministra da Cultura Margareth Menezes estabelece novas regras para estimular e fazer cultura no país. 

Todos são contemplados com suporte cultural direto – Leis Rouanet, Paulo Gustavo, Aldir Blanc, Cultura Viva entre outras políticas públicas – com padronização das regras para o acompanhamento da prestação de contas e transferência de recursos federais. Assim parece que se acende uma luz no fundo do túnel.

 O que antes parecia um sonho, uma utopia, hoje é realidade.  A tarefa é árdua e a caminhada é longa pela frente para conseguirmos construir um Brasil melhor. 

 

Não podemos esquecer a grande aposta dos Estados Gerais da Cultura no lema “com arte, ciência e paciência mudaremos o mundo”.