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‘Pra não dizer que não falei de flores’

“Caminhando e cantando e seguindo a canção somos todos iguais braços dados ou não (..) vem vamos embora que esperar não é saber, quem sabe faz a hora, não espera acontecer(…) ainda fazem da flor o seu mais forte refrão e acreditam nas flores vencendo o canhão. (…)

Quem viveu essa época sabe como a poesia, música, enfim a arte em todas as suas manifestações tiveram um papel fundamental como testemunhos de um tempo sem liberdade. Mas falando em flores como substituta da violência vamos seguir a recomendação de Oliver Sacks e seguir caminhando e cantando para neutralizar o desamor.

Natureza

Quando o assunto é a relação do homem com a natureza, lembro-me do biólogo inglês Rupert Sheldrake e seu hábito particular de meditar

“Na solidão me transporto a uma floresta portátil guardada em algum cantinho da minha mente, como se estivesse carregando ela dobrada comigo dentro do bolso e para onde vou a abro à minha volta quando necessário. Em seguida, sento-me aos pés das árvores velhas enormes da minha infância. Desse modo faço as minhas perguntas e recebo as minhas respostas”.

Essa frase de Sheldrake me acompanha há muitos anos.Tenho ela como uma regra a ser seguida e por diversas vezes me transporto para lugares que amei conhecer e que dão energia para continuar minha caminhada. Recebo minhas respostas ou no balanço da rede em Itapoá, ou no mar calmo olhando o horizonte, seja num jardim cheio de flores perfumadas e coloridas.

Quando estou na companhia de mim mesma gosto de passear por estes lugares que me encantaram por alguns momentos. Impossível esquecer Giverny, onde Claude Monet concretizou seu sonho de colocar em só lugar as flores do mundo inteiro. É um lugar único no mundo em matéria de diversidade de flores.

Jardim de Mara

Jamais esquecerei a primavera no jardim de Mara, em Itapoá, num ano qualquer que passei por lá. Os pássaros estavam tão entusiasmados com a profusão de nuances do verde e cores daquele jardim, que chegavam pertinho da gente para brincar pelo gramado. Até no retrovisor do carro eles se empoleiraram e ficaram, sem mentira, olhando o espelho.  “O espelho fascina eles”, justificou Amauri, o marido de Mara. Na foto, Mara está no meio entre minha irmã Rose e minha mãe.

Minha casa

Outro jardim que me faz bem lembrar é o da minha antiga casa. O Ipê amarelo quando florescia deixava a grama inteira enfeitada depois que centenas de barulhentos periquitos sugavam o néctar das flores e deixavam ela cair. Neste espaço, a jardineira era eu e como sempre adorei diversificar, deixei meu jardim muito democrático e sem um estilo específico. Tudo que encontrava plantava nele. Acacia Mimosa, margaridas, orquídeas,  tantas flores que nem seu nome saberia dizer. A biodiversidade brasileira em alguns metros quadrados de terra.

Música

Música e jardim fazem bem a mente, assim disse Oliver Sacks, o médico e escritor. ‘Pra não dizer que não falei de flores’ foi a inspiração para este artigo que apresentou aos leitores os jardins que se destacaram na minha memória. Só pensar neles, meu espírito suaviza-se e posso acreditar que a vida é bela!

Certamente, não foi por acaso que o texto falou de flores para uma mente sadia e buscou na música de Geraldo Vandré a inspiração para encerrar o pensamento, com viés político sim. É importante lembrar que a política é uma organização social e está em todas nossas atividades.

‘Pra não dizer que não falei de flores’, de Vandré ganhou o segundo lugar no Festival Internacional da Canção em 1968. A beleza de suas rimas, de um lirismo profundo sobre justiça social, amedrontou o poder autoritário brasileiro da época e a partir de 69 proibiu que a canção fosse tocada por quase 20 anos.

 Quanto mais lembro dessas histórias, mais necessito desdobrar meus jardins portáteis e penetrar nas e cores e nos perfumes das flores para encontrar a resposta sobre o que está acontecendo com o meu Brasil.

 

 

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Oliver Sacks já dizia que jardim e música fazem bem para a mente

Muita música e visitas a jardins são iniciativas vitais como ‘terapia’, não farmacêuticas, para pessoas com doenças neurológicas crônicas. A prescrição foi do médico neurologista Oliver Sacks ( 1933 – 2015) que sempre teve toda a licença poética para falar sobre o assunto. Sacks, além de médico era professor e também foi autor de vários ‘best-sellers’. Um médico dos homens e das almas.

Matéria originalmente publicada no site Brainpickingns

“Eu trabalho como um jardineiro”, escreveu o grande pintor Joan Miró em sua meditação sobre o ritmo adequado para o trabalho criativo. Não é por acaso que Virginia Woolf teve sua epifania eletrizante sobre o que significa ser um artista enquanto caminhava em meio aos canteiros de flores no jardim de St. Ives.

De fato, jardinagem – mesmo que seja apenas para estar em um jardim – é nada menos que um triunfo de resistência contra a raça impiedosa da vida moderna, tão compulsivamente focado na produtividade à custa da criatividade, da lucidez, da sanidade.

Um lembrete de que somos criaturas enredadas com a grande teia do ser, na qual, como o grande naturalista John Muir observou há muito tempo atrás, “quando tentamos descobrir qualquer coisa por si só, achamos que ela se atrelou a tudo o mais no universo”; um retorno ao que é mais nobre, o que significa mais natural em nós.

Há algo profundamente humanizador em ouvir o farfalhar de um folha recém-caída, em observar um amor de abelhas e zangões em uma flor, ajoelhando-se  na terra para fazer um buraco para uma muda, mover gentilmente uma minhoca assustada ou duas para fora do caminho . Walt Whitman sabia disso quando pesou o que faz a vida valer a pena quando ele convalesce de um derrame que o fez paralítico:

‘Depois de você ter esgotado o que há nos negócios, na política, no convívio, no amor e assim por diante – descobrimos que nenhum deles finalmente  nos  satisfaz tanto e nos usa permanentemente  – o que resta?  A natureza. Ela permanece para trazer para fora de seus recessos entorpecidos, as afinidades de um homem ou mulher com o ar livre, as árvores, os campos, as mudanças das estações – o sol de dia e as estrelas do céu à noite ”.

Oliver Sacks

Essas considerações fazem parte do ensaio escrito pelo neurologista e escritor Oliver Sacks (1933-2015) intitulado “Por que precisamos de um jardim” , que está no livro Everything in your Place: First. Loves and Last Tales. O livro não foi traduzido para o português e na versão em inglês pode ser encontrado na internet.

“Como escritor, considero os jardins essenciais para o processo criativo; Como médico, levo meus pacientes a jardins sempre que possível. Todos nós tivemos a experiência de vagar por um exuberante jardim ou por um deserto atemporal, andando junto a um rio ou oceano, ou escalando uma montanha e nos achando simultaneamente acalmados e revigorados, engajados na mente, refrescados em corpo e espírito. A importância desses estados fisiológicos na saúde individual e comunitária é fundamental e abrangente. Em quarenta anos de prática médica, descobri que apenas dois tipos de “terapia” não farmacêutica são de vital importância para pacientes com doenças neurológicas crônicas: músicas e jardins”.

Citando Oliver Sacks tratando de um assunto que parece óbvio, sobre o sentir-se bem dentro do um jardim e sobre a importância da música  na psique humana, foi exatamente para lembrar aos leitores de algo tão simples capaz de traçar um novo caminho para nós.

Dar-se o direito, de vez em quando, de perder-se no perfume e nas cores de um jardim ou no ritmo de uma boa música. 

 

 

Foto via site Exibart

Nudez censurada gera protesto. Até Botero violou as normas da web

O fotógrafo americano Spencer Tunick  reuniu 125 pessoas nuas perto da sede do Facebook, em Nova York. Protesto contra as restrições da rede social para fotos sobre nudez. Falando em censura vale aproveitar o espaço e contar que as obras de Botero deram o que falar para a editoria do PanHoramarte.

Pasmem!

Na página em que se trata da Inquietude Estética de Botero e o vazio no olhar foi proibido veicular anúncios da Google AdSense. A poética irônica e crítica do artista colombiano feriu a moral e os bons costumes de algum anunciante da AdWord (sistema utilizado pela Google para quem quer anunciar) que notificou o AdSense(sistema que paga pelos anúncios publicados em seu site), sobre violação de normas. O site recebeu um e-mail sobre violação de normas da política de veiculação de anúncios e os passos para regularizar a situação.

No painel do AdSense para o site, a matéria que violava as normas de veiculação de anúncios era a de Botero, segundo a Google, que continha imagens de conteúdo sexual ou moral . Achei que era a imagem de dois nus que constava na matéria. Fiz a correção e solicitei reavaliação. Para minha surpresa a resposta foi a seguinte:

 “página foi revisada mediante sua solicitação. Ela não estava em conformidade com as nossas políticas no momento da revisão. A veiculação de anúncios continuará restrita ou desativada nessa página”.

Como a restrição era somente para aquela página não fui adiante na pesquisa sobre as causas. Presumo que sejam as fotos de padres com feições ridicularizadas. Enfim, o fato de associar o caso ao protesto de Nova York apenas é para fortalecer a ideia de que não existe imoralidade na arte. Portanto, retornei com os nus e imaginei que o reclamante deveria ser um rígido beato religioso. Talvez…..

Spencer Tunick

O protesto de Tunick é pela censura praticadas pelo Instagram e Facebook contra fotos de seios femininos. Spencer Tunick é um fotógrafo americano que no passado agiu em favor da liberdade do corpo. Ele pagou por agir assim. Em 1994, o artista foi preso no Rockfeller Center, em Manhattan, enquanto estava retratando uma modelo completamente nua, posando ao lado de uma árvore de Natal.

“Mas o fotógrafo não desistiu, de fato, em 2000, ele ganhou uma ação contra o Estado de Nova York para encenar e legalmente e fotografar suas instalações em massa e imediatamente relançou em grandes números: 6 mil pessoas nuas na praça em Bogotá , em seguida, 7 mil em Barcelona e depois 18 mil na Cidade do México, o recorde alcançado.

Desta vez, o grupo de nus é mais restrito e mais feroz e pode contar com o apoio da Coalizão Nacional contra a Censura, bem como de um movimento que se tornou viral naquelas plataformas acusadas de censura, através da hashtag #wethenipple.

Vários artistas e ativistas de Nova York doaram generosamente imagens de seus mamilos à causa, incluindo Andres Serrano, o ator Adam Goldberg e o baterista do Red Hot Chili Peppers, Chad Smith. As imagens foram então ampliadas e atribuídas aos participantes na performance, com base no tom da pele e no tamanho da aréola, para cobrir / censurar polemicamente as partes em questão.

A censura dos nus, em particular os femininos, na verdade, é um tema espinhoso, principalmente porque as mídias sociais tornaram-se parte integrante da pesquisa e dos interesses artísticos, bem como das atividades cotidianas.

Ultimamente, o Facebook tem mostrado sinais de abertura e, além de ter implementado o algoritmo que gerencia os conteúdos controversos, também impulsionou seu programa de investimento no setor de arte, depois de ter tropeçado em casos bastante embaraçosos, como a censura em Vênus de Willendorf e o Julgamento de Paris, de Rubens, julgados demasiado indecisos pelo sistema de reconhecimento automático que, evidentemente, não deve ser muito irônico na arqueologia e na arte moderna, mas nem mesmo ao mesmo tempo, dado que também sofreu um erro com as fotografias de Marina. Abramovic.

“Estamos aqui para protestar contra as regras rígidas contra nudez e censura”, disse Tunick, sugerindo que o Facebook e o Instagram possam seguir o método usado pelo YouTube, que ativou “Um processo de verificação para artistas, uma plataforma que permite que eles compartilhem seu trabalho ». Na primavera passada, o Facebook publicou uma atualização que permitiu a publicação de imagens de pinturas e esculturas retratando assuntos nus, no entanto, o trabalho artístico dos fotógrafos continua vulnerável.

Nas diretrizes atualmente usadas pelo Facebook e pelo Instagram, os mamilos femininos só podem ser expostos em contextos muito específicos, como a amamentação ou para descrever as consequências das operações de mastectomia. A este estudo de caso também poderiam ser acrescentadas as motivações artísticas, embora seja óbvio que este contexto é mais nuançado e menos setorial, comparado ao médico”. Fonte: Exibart

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Etiópia pede o retorno de tábuas sagradas mantidas no British Museum

A devolução de valiosas obras arte por parte de museus europeus, saqueadas em períodos de colonização e guerras, provoca discussões acaloradas. Verdadeiros tesouros arquelógicos, de valor histórico-artístico inestimável. O impasse agora é mais sério e envolve o British Museum. Trata-se de 11 tábuas sagradas ainda utilizadas em cerimônias religiosas na Etiópia.

A dúvida é sempre em relação a quem tem o direito pelo objeto, aquele que o mantém como uma espécie de alienação fiduciária, ou aquele de onde o objeto é originário.Uma matéria publicada recentemente no site The Artnewspaper , assinada por Alexander Herman, diretor assistente do Instituto de  Arte e Direito, expõe o caso do museu britânico e coloca mais ‘lenha da fogueira’.

Devolução onerosa

 “O Museu Britânico parece gostar de contar ao mundo suas restrições legais. Sempre que pretensos pretendentes se aproximam do museu em busca de restituição de um objeto da coleção, a resposta quase mecânica do museu é que seus curadores são impedidos de fazê-lo, mesmo que o desejem, devido às restrições onerosas à desativação de itens de coleção encontrados dentro do British Museum Act 1963.

Isso tem sido parte da resposta aos representantes gregos em relação às Esculturas do Partenon e, mais recentemente, à delegação de Rapa Nui (Ilha de Páscoa) que, emocionalmente, pediu para que a gigante moai entalhada retornasse a Ilha”.Fonte: The Artnewspaper.

Invisíveis

As tábuas sagradas (cristãs) simbolicamente representam a Arca da Aliança – citada na Bíblia.  Para igreja ortodoxa etíope, os textos sagrados não devem ser vistos por ninguém, salvo os sacerdotes. O Museu Britânico relaciona as tábuas no grupo de objetos ‘invisíveis’. Elas encontram-se mantidas, como confidenciais, em depósito lacrado, no próprio Museu. Nem o guardião da ala da África, Oceania e das Américas pôs o pés na sala ou muito menos viu os objetos.

Empréstimo

O empréstimo tem sido uma solução aceitável por ambas as partes e em alguns casos é a saída para o impasse. O diretor do museu britânico sugeriu o empréstimo das 11 tábuas a longo prazo, quando reuniu-se com a delegação e prometeu que a proposta seria encaminhada aos curadores.

“Mas no caso dos 11 tábuas, um empréstimo simplesmente não funciona. Estes são itens de grande importância para uma igreja ativa na Etiópia hoje. Eles foram levados em circunstâncias particularmente oprimidas durante uma invasão punitiva. Eles não estão servindo a nenhum propósito museológico ou acadêmico dentro da instituição e criam um obstáculo desnecessário para as autoridades da igreja que procuram venerá-los”. Alexander Herman

E o leitor já tem uma opinião formada sobre o assunto? Sem dúvida, complexo, sobretudo se considerarmos que muitas obras foram preservadas por estarem exatamente num museu. No entanto, é justa essa posse se os objetos foram saqueados ou até mesmo roubados em períodos de conflito?