Cenas de Brumadinho. Painel de Inhotim. Foto por Mari Weigert

Viajar é protagonizar o personagem principal de um filme

A sensação de ser a personagem principal de um filme ao viajar, cujo roteiro e direção é de tua autoria, sobretudo a um lugar fora do país de origem começou partir de 2005, quando voltei à Europa, depois de 13 anos da última viagem que fiz ao velho mundo.

Penso, cá com os meus botões, que é o cenário europeu que dá a sensação de viver essa fantasia.

Portanto, começo a protagonizar esse filme, em que determino o local das cenas e programo o roteiro, a partir do momento em que coloco os pés no avião (ainda não viajei de navio) e recebo os votos de boa viagem dos comissários de bordo. As centenas de pessoas que estão espremidas nas poltronas, naquele gigante aéreo, tornam-se parte da minha família durante algumas horas.

Boas amizades

Nestes instantâneos de viagem, entre um percurso e outro, já fiz boas amizades e até hoje me comunico com elas por e-mail ou por telefone, ou nas redes sociais. Neste caso, Fany é uma dessas amigas. Uma curitibana que encontrei na fila do embarque para Roma, cerca de dois anos atrás. Fany disse que não falava nenhum outro idioma além do português – apesar de ter demonstrado agilidade na mímica e se fazia entender muito bem quando queria – e pediu que eu a ajudasse no caso de problemas.

E houve. Sua mala não chegou a Roma, no avião em que viajava, e demorou algumas horas para que ela pudesse reavê-la. Fiquei do lado dela até se resolver tudo e assim eu e Fany ficamos amigas. Fui apresentada a Lara sua filha, que vive em Roma e a esperava no aeroporto.

Resumindo, sempre que é possível nos encontramos. Detalhe: encontro-me mais com Lara que vive em Roma, quando viajo, do que com a própria Fany em Curitiba, onde vivemos. Pode? … .Pode sim, pois nunca achamos tempo no dia-a-dia para desfrutar dos prazeres de um encontro amigo, diferente das férias que nos dá direito a tudo.

Uma grande família

A sensação de acreditar que todos os brasileiros que encontramos no exterior se transformam na tua família deve-se ao fato de nos sentirmos órfãos quando deixamos a nossa terra natal, mesmo que a viagem seja por pouco tempo. No meu caso, em especial, me sinto mais carente e vulnerável e encontro alguns também que estão se sentindo desta forma pelo caminho.

É importante frisar que esta reflexão sobre os sentidos de uma viagem são próprias da minha personalidade… Muito deslumbrada com tudo!

Em síntese, depois de 2005 fiz alguns roteiros inesquecíveis e cada qual com uma história para contar e um amigo deixado no país longínquo.

A carioquinha Mariana foi outra amiga conquistada nestas andanças pelo mundo afora. Menina ainda e muito corajosa nos seus 22 anos, em 2007, quando a conheci na Turquia. Pela pouca idade lembrei-me das minhas filhas e quase a adotei na longínqua Istambul. Apaixonei-me pela cidade porque ela me foi mostrada pelos sentimentos e o olhar de Mariana que é sensível e aprecia a arte e o belo.

A amizade do peruano Julio Guilhermo foi outra história de destaque nos meus diários de viagem. Julio tinha um táxi em Lima, no Peru, e fazia roteiros turísticos pela cidade e por ter sido nosso guia por Lima o inseri no texto de uma matéria de turismo sobre o Peru e o Machu-Pichu.

Nunca mais Julio esqueceu esta gentileza e nos tornamos bons amigos via e-mail e MSN. Depois de alguns anos, Julio foi trabalhar em Barcelona e ano passado, quando visitei a terra de Gaudi encontrei com o peruano que me orientou nos passeios e me fez experimentar uma saborosa “paeja” e bailar na cadência de uma sensual “salsa”.

Como podem notar, nas viagens protagonizo as cenas que o ambiente me propicia. Minha alma se agiganta e me sinto a dona do mundo. A partir daí, posso viver a bailarina, a deusa num templo sagrado do passado, a aventureira buscando experiências na vida, ou simplesmente uma mulher curiosa em conhecer lugares, pessoas e boas sensações para estimular outros a realizarem a experiência.

Conselho

Nunca esqueço o conselho de um médico para um amigo meu que estava em dúvida em gastar tanto dinheiro numa viagem mais longa. Ele disse: “o que você prefere, usar esse dinheiro conhecendo novas pessoas, outras culturas, relaxar e desfrutar da vida ou mais tarde em tratamentos e remédios.

 

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Uma viagem de turismo, tem a função de romper com o cotidiano que às vezes massacra e oprime nossos dias, proporciona a condição de olharmos para nossa vida pela lente da poética artística, acrescentando a experiência que se tem ao vivenciar outros lugares e conhecer novas pessoas.  A escolha é tua!

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Ex-libris – A importância de ter a sua própria biblioteca

Esse fim de semana fuçando na minha estante de livros, encontrei uma coleção intocável que comprei há uns 12 anos e nunca li essas obras. Ali estava eu e Machado de Assis frente a frente, de novo, depois de tantos anos.

Eu olhava para os livros e os livros olhavam pra mim: será que já não era hora de encarar de novo?! Depois de todos esses anos, esses livros seguem na minha prateleira e agora sem o temido vestibular, sem nenhuma prova em vista e nenhuma obrigação de ler.

Lembro-me bem do meu primeiro dia na universidade; a curiosidade, o saber e a vontade de estudar se uniam naquela sala de aula. Dentro daqueles muros de concretos, das paredes frias da PUC(Universidade Católica do Paraná), eu comecei a caminhar em direção ao meu futuro profissional… e ainda lembro da voz dos professores, naquele primeiro dia, com sua folha chamex impressa com umas 20 referencias bibliográficas.

Biblioteca particular

Os professores nos diziam que tínhamos que comprar esses livros e com eles, começar a construir a nossa biblioteca privada; o nosso pequeno cantinho do saber, o lugar onde possamos buscar conforto quando alguma informação nos falte.

Durante muitos anos eu tive a minha biblioteca: em Curitiba, em Londres, em Pontevedra, no Porto, em Santiago de Compostela e finalmente agora em Madrid, na Espanha. Em todos esses lugares também tive que fazer seleção do que vinha comigo e do que ficava, porque mudar-se significa abrir mão de coisas. E os livros entram também na categoria “coisas”.

É engraçado que nunca tenha jogado fora o meu exemplar de “Quincas Borba” ou de “Esaú e Jacó”. E com eles, outros que eu já tinha lido e que estão “de dar pena” de velhos e capengas. Mas estão aí: e toda vez que eu olho pra eles consigo visualizar ainda o momento que os li. E nessa lembrança, o momento me acompanha e começo a recordar também a idade que tinha, o que eu fazia, os choros, as risadas, as travessuras.

Momento Certo

Foi no meio dessa euforia de lembranças e saudades, com meu “Quincas Borba” na mão, que decidi que já era hora. Até o suplemento de leitura estava dentro do livro, com perguntas das  UM-SP, UFMG, etc.

Pois é. Era hora de encarar de novo, afinal até hoje não o tinha jogado fora. E como dizia meu professor José Carlos Fernandez, “os livros parados na prateleira não estão parados por acaso, apenas estão esperando o momento certo para ser lidos”. Acho que nunca vou esquecer suas palavras; tenho muitos livros na minha prateleira esperando o momento certo para ser lidos. E mesmo depois de anos e anos eles estão ali, firmes e fortes esperando por mim.

O meu momento com Machado chegou de novo. E você? Quem está esperando por você?

Ex- libris

20170309_065110Ex libris (do latim ex libris meis) é uma expressão que significa “dos livros de” ou “da biblioteca de”. Aqui na Espanha, muitos bibliófilos fazem carimbos personalizados, com o escudo da família ou um desenho maneiro para marcar todos os exemplares da sua biblioteca.  Geralmente são selados na contracapa ou na página rosto do livro.

Origem

Não se sabe a origem exata do termo “Ex-libris”, embora essa necessidade remonta a invenção dos tipos móveis por Gutemberg, quando os livros eram muito caros e somente pessoas com muito dinheiro e educação os possuía.

No British Museum, por exemplo, junto a uma caixa de papiros de aproximadamente 1400 a.C., há uma placa de cerâmica em que disse que tais papiros pertencem a biblioteca do faraó Amenofis III.  Já na Península Ibérica, o primeiro Ex-libris que foi encontrado é o do rei Fruela I (756-768), no reino de Astúrias.

Já na Idade Média, também, muitos nobres, bibliófilos, solicitavam que se pintassem o escudo da família no inicio do volume, indicando que pertencem à, ou a família de.

Mas é com o surgimento da imprensa, em pleno século XV, que se encontram os primeiros indícios dos Ex-libris. Os escudos já não podiam ser pintados nos livros ou manuscritos, e os proprietários geralmente escreviam o seu nome na folha de rosto.

Alguns amantes dos livros começaram a utilizar um tipo de Ex-libris fixos; outros, gravados ou impresso numa folha avulsa, que depois se encadernava junto ao livro.

O mais conhecido, no entanto, foi o ex-libris móvel, colado dentro do volume, na página de rosto ou no verso do livro.

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A coragem de Anna Pauline

Nesse Dia Internacional da Mulher a história de Anna Pauline Weigert é a mais apropriada para compor meu artigo sobre sagacidade da mulher.

À pequena, corajosa e determinada alemãzinha de Breslau, que com seus 33 anos, pegou seus quatro filhos a tiracolo, em pleno século XIX, embarcou num navio rumo ao Brasil, para encontrar o marido que há um ano não mandava notícias, dedico esse texto, como uma homenagem justa a quem não teve medo de ousar.

Pé-de-meia

Se Hermann, o marido, tinha como objetivo retornar à Alemanha depois de ter feito o ‘pé-de-meia’ perdeu a chance. Nunca mais conseguiram voltar para a terra natal. Graças à decisão dela que os Weigerts, da parte de Hermann criaram uma grande família nesse país tropical.

O alemão, então com 38 anos, foi contratado pela Compagnie des Chemins de Fer Brèsiliens, para trabalhar na estrada de ferro Curitiba-Paranaguá. Chegou no Brasil em 1879. “Passaram-se meses, e ele, atarefado com seus rebites (sua função era colocar rebites nas pontes e viadutos metálicos para a junção das peças) nada de dar notícias”, escreve Eno Theodoro Wanke, pg. 108,  A Saga dos Imigrantes  – Memória.

“Quando se completou o primeiro aniversário da vinda de Hermann, que fez Anna? Vendeu tudo o que tinham e embarcou num navio em direção a Paranaguá, com filhos e bagagens. Chegando aqui, Hermann quase desmaiou de susto ao vê-la. Sua vinda significava o fim das esperanças de regresso. E efetivamente, assim foi”.

Esses detalhes foram contados de pai para filho, passando pela família ao longo dos anos.

As ‘broas’

O escritor Eno Theodoro Wanke, um dos bisnetos, para compor o seu livro, fez um pesquisa sobre essas memórias familiares. Um dado que Eno não cita no livro, mas quem contava era meu pai, Egon, neto dela, filho de Eduardo – que nasceu no Brasil, era que Anna Pauline já tinha economizado o dinheiro vendendo ‘broa’, o pão de centeio, na Alemanha, muito antes de sua vinda de fato. Ocorreu que seu irmão bateu num oficial do exército prussiano e ela deu a ele todas as suas economias para que pudesse fugir.

A vida de Anna não foi nenhuma maravilha quando chegou no acampamento perto de Morretes e segundo contam fazia suas ‘broas’ em um forno improvisado naqueles enormes cupinzeiros do mato (termitas). O quinto filho, uma menina, nasceu no acampamento. “Era uma noite de chuva, e as condições do rancho onde ela estava eram tão precárias que chovia abundantemente sobre a cama das parturiente. O jeito foi algumas mulheres abrirem guarda-chuvas sobre ela para protegê-la das goteiras”.

Tramoia

A filha mais velha de Anna Pauline se chamava Marie, minha bisavó materna, na época com nove anos. Essa tramoia de bisavó e tataravó ao mesmo tempo é culpa de meu pai que resolveu se apaixonar e casar com a prima em segundo grau, minha mãe. Anne Pauline era mãe do meu avô paterno e avó do meu avô materno, sua filha Marie era mãe do pai da minha mãe. Confuso, né!  Por isso, acho melhor parar por aqui.

Principalmente porque o foco é o Dia Internacional da Mulher.  A história de Anna Pauline conto e reconto com muito orgulho porque prova a força das mulheres. Se recebi uma centelha, que seja de sua coragem e ousadia já basta para seguir em frente!

 

 

 

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O balanço da rede e o equilíbrio da solidão em Itapoá como era ontem

Itapoá, em Santa Catarina, está perdendo suas matas e os belos pássaros estão deixando de visitá-la…

imagem, um pedaço de mar.
Um pedaço de mar visto da sacada é como se fosse o paraíso.

No balanço da rede em Itapoá de ontem encontro o equilíbrio que necessito para criar novos projetos. Digo Itapoá de ontem, em Santa Catarina, aquela que ficou guardada a sete chaves na minha mente. Hoje, a cidade catarinense se moderniza a cada momento pelo porto particular que se instalou há poucos anos.

Floresta Portátil

Portanto,cada vez que preciso ficar sozinha me transporto ao cantinho da rede que me embala na sacada de Itapoá. Isso me faz lembrar  o que disse o biólogo e escritor inglês Rupert Sheldrake, numa entrevista, mais ou menos assim:

“Na solidão me transporto a uma floresta portátil guardada em algum cantinho da minha mente, como se estivesse carregando ela dobrada comigo dentro do bolso e para onde vou a abro à minha volta quando necessário. Em seguida, sento-me aos pés das árvores velhas enormes da minha infância. Desse modo faço as minhas perguntas e recebo as minhas respostas”.

A beleza me tocava o coração de tal forma que Itapoá virou meu cantinho de cura
A beleza me tocava o coração de tal forma que Itapoá virou meu cantinho de cura

No vai-e-vem do balanço da rede naquela sacada rodeada de verde, em Itapoá, a minha mente voava longe e no infinito dos sonhos trazia para mim, muitos projetos e um repouso curativo durante o período mais difícil de minha vida.

O progresso

Era e continua sendo a casa de minha irmã. Mas de 2011 para cá muito coisa está mudando.

imagem,caminho de terra e mar Terra, areia e grama, juntam-se e deixam o caminho gostoso
Terra, areia e grama, juntam-se e deixam o caminho gostoso

A rua que passa na frente da casa ainda  é sem asfalto. Terra, areia e grama, juntam-se e deixam o caminho gostoso de pisar, morno no verão e enlameado nas chuvas.

imagem,pássaro. Será ele existe ainda numa cidade em que o progresso chegou?
Foto feita em 2010. Provavelmente seus filhotes não estão mais por perto. As árvores foram cortadas por ali…
Cadê os passáros

Aqueles pedaços de terra cheios de mato ainda existem, mas estão ficando cada vez mais distantes, perto da serra e longe das casas. Os terrenos abrigavam os passarinhos mais belos e coloridos do planeta.

bromélias e pássaros povoavam as árvores
bromélias e pássaros povoavam as árvores

Talvez sobrem algumas árvores, onde crescem  bromélias das cores rosa e vermelha  grudadas em árvores antigas e ainda têm pés de maracujá, goiaba, caju, coquinho que se misturam aos cipós  e outras espécies de árvores que formam a imagem luxuriante da floresta Atlântica, no sul do Brasil.

Um toque no coração

Mas a beleza me tocava o coração de tal forma que escrevi em 2011, um texto resumindo o tratamento para acalmar a mente feito em Itapoá, meu cantinho de cura.

a rua só tinha cinco casas...
A rua só tinha cinco casas.

“A rua tinha cinco casas com moradores que se conhecem há mais de 20 anos.

Meu pai batizou-a como a Rua das Estrelas. Pintou uma placa cheia de estrelas e pregou num pau comprido no início da rua.  Não sei se foi para homenagear as duas filhas ou porque a praia tinha muitas estrelas do mar.

Ohhh!  Dúvida atroz que me atormenta a auto-estima. .. Um nome poético e próprio para quem tinha alma de artista, logo destruído pela rude prefeitura que simplesmente numerou as ruas e as deixou sem nome. Que triste isso!

Agora o sobrado verde rodeado de sacadas espaçosas  que fica distante  uma quadra do mar está na rua 1.690. Que falta de criatividade!

Abrir as portas e as janelas e deixar o sol entrar.
Era chegar na casa e começar e abrir as portas-janelas para deixar o ar puro entrar depois de permanecer fechada por algum tempo.

Bem, não importa. O que mesmo importa é a sensação agradável  de chegar na casa e começar e abrir as portas-janelas para deixar o ar puro entrar depois de permanecer fechada por algum tempo.

Cantinho mágico

cantinho mágico
cantinho mágico

Terminado o  ritual inicial, o segundo passo é engatar a rede no cantinho mágico da sacada, escarrapachar-se naquele tecido rústico de algodão forte e macio que se molda ao teu corpo, dar impulso com o pé nas ripas da sacada para iniciar o vai-e-vem da rede. Em seguida é só deixar que a brisa acaricie o teu rosto e ao mesmo tempo embale os teus devaneios até adormecer ao som das ondas do mar e da sinfonia da natureza.

É um mimo que o planeta presenteia  a qualquer mortal e  para quem desejar experimentar  e perceber todos estes detalhes, que transformam um lugar tão singelo num espaço extraordinariamente significativo.

Um cantinho de sacada que mostra um pedaço de mar, onde o barulho das ondas, os grilos à noite, e os passarinhos durante o dia, nos deixam num voluptuosa sensação de  prazer .

Bom da cabeça

A água de poço com enxofre, o chuveiro fora (existe um dentro das casa, mas pouco se usa no verão), os cômodos arejados e espaçosos, a brisa refrescante do mar, a mata nativa no fundo quintal, os saudáveis banhos de sol e mar, peixe fresquinho  na mesa.

Tudo isso, compõem um conjunto de ingredientes capaz de levantar um moribundo e deixar você “bom da cabeça e certo do juízo de novo”, como diziam os antigos.

A paisagem era luxuriante. Já não existe mais. Vai dar lugar ao progresso.
A paisagem era luxuriante. Já não existe mais. Vai dar lugar ao progresso.

Itapoá me ajudou a dizer adeus a “fluxuotina”e neste cantinho encantado eu dormi horas, dias, em sono profundo me recuperando de um cansaço mental provado pelas dores da vida. A cada dia que usava este método de cura dava mais um passo para me desvencilhar da dependência por medicamentos e me tornava auto-suficiente nas minhas emoções.

Os meus aliados nesta empreitada difícil foram os banhos –  primeiro no mar de água morna, em que as ondas inquietas brincavam o tempo todo com o equilíbrio do meu corpo.  Depois de chuveiro com água gelada e fedida, cheirando ovo podre, que me deixavam com uma sensação de bem estar , certa de que a circulação sanguínea  estava rápida e movimentava no meu organismo me restituindo a força vital.

Ao final, a comida gostosa na mesa, livro bom para ler, e o sono recuperador na rede no alto da sacada. Este era o momento mais saboroso para mim. …

Itapoá, em Santa Catarina
Itapoá, em Santa Catarina.
Lugar de inspiração

Confesso que muitos dos meus projetos de vida saíram deste espaço pleno de natureza. O lugar é especial. Deve ser por isso que as pessoas que vivem lá  são felizes , deixam o tempo passar sem preocupação.

Os bailões da Tia Cida dão Ibope e mantém o galpão lotado de dançarinos  todos os sábados à noite.  É turista meio sem graça no começo. Pescador com sandália de dedo e jeitão simples.

Vendedor de rede na praia, comerciante da região – todos, que neste momento estão mesmo nível social,  sincronizam-se ao som de um vanerão bem tocado e  o balanço das cadeiras das mocinhas e também das senhoras de mais idade entram na cadência dos passos do dançarino.

Todos estão ali desfrutando do simples prazer de dançar  uma boa música regional.

Tudo é tão peculiar neste espaço que une mar, mato e o bicho homem, que até a forma de achar o lugar certo para cavar um poço foi na base da forquilha de pêssego. Não é lenda não!

Faz algum tempo, um homem que vivia na região conseguiu achar  água com o galho de árvore de  duas pontas  e  na hora que as pontas vibraram ….. pronto! Achou o lençol freático.  Minha irmã o contratou especialmente para fazer o serviço e lá está o poço até hoje abastecendo a casa.

Solidão compartilhada

Cada vez que preciso ficar sozinha me transporto ao cantinho da rede que me embala na sacada de Itapoá. Então sigo o exemplo do escritor e biólogo inglês, apenas com a diferença que no lugar da floresta portátil coloco o sobrado verde com a sacada ensolarada e me deito na rede.

Desse modo, embalada com a brisa do mar e a sinfonia da natureza formulo as minhas perguntas …”

Assim conclui meu texto em 2011 e tenho na lembrança todos os detalhes do lugar como era antes. Agora somente a rua permanece sem asfalto, mas os terrenos estão perdendo as árvores e dando lugar para muros altos e casas.

Mas o progresso não atrapalha minha doce meditação. Só a saudades é que aperta o coração.

imagem, rede na sacada. Lugar de relax..
Só a saudades do verde no entorno é que aperta o coração.