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Em nome da liberdade se aprisiona Queermuseu

Vocês sabem o que é Queer? Talvez nunca irão saber porque um movimento brasileiro que levanta a bandeira por um país livre, justamente em nome da liberdade limita a arte, coloca estereótipos e a aprisiona. Estamos falando do fechamento por parte do Santander, da mostra Queermuseudepois de uma série de protestos por parte do MBL (Movimento Brasil Livre).

Nesse grande equívoco o que está em jogo não é a moral e os bons costumes de uma sociedade hipócrita, sim, o poder econômico e manifestações políticas.

O que é Queer?
Bathing 1911 Duncan Grant 1885-1978 Purchased 1931 http://www.tate.org.uk/art/work/N04567
Bathing 1911 Duncan Grant 1885-1978 Purchased 1931 http://www.tate.org.uk/art/work/N04567
O significado literal é “estranho, curioso”. Em abril de 2017, o Tate Britain, em Londres, abriu uma impressionante exposição que chamou de Queer British Art, e explica o por quê dela.
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Como muitos museus e galerias da Grã-Bretanha, o Tate também quis comemorar o 50º aniversário da criação da Lei de Ofensas Sexuais, a legislação que despenaliza parcialmente  o homossexualismo masculino na Inglaterra e no País de Gales.
Sappho and Erinna in a Garden at Mytilene 1864 Simeon Solomon 1840-1905 Purchased 1980 http://www.tate.org.uk/art/work/T03063
Sappho and Erinna in a Garden at Mytilene 1864 Simeon Solomon 1840-1905 Purchased 1980 http://www.tate.org.uk/art/work/T03063

A mostra faz uma abordagem histórica, educacional e abrangente e também apresenta um rico repertório de obras de vários gêneros, das ilustrações de Aureu Beardsley, ao drama de Oscar Wilde(1983), Salomé, a poderosa imagem pop dos anos 60 de David Hockney.

 O termo Queer responde à necessidade de escapar de todos os rótulos que, tendencialmente, ou por provocação e ofensivamente, foram utilizados ao longo dos anos para identificar gêneros e identidades que por natureza não se enquadram em uma categoria, mas que, pelo contrário, rejeitam qualquer aspecto do conformismo. (fonte Exibart).
 
Além do Exibart, alguns sites especializados comentaram a atitude arbitrária do Banco Santander e de alguns segmentos da sociedade brasileira. Hyperallergic, The Guardian, entre outros.
Inquisição

A inquisição ressurge no século XXI, com toda a força no Brasil, desta vez a caça tem como alvo o artista.

A arte é testemunho da história e o reflexo da realidade. Independente de partidos ou corrente religiosa, a arte é a manifestação mais sensível do homem. Representa a sua percepção diante do mundo.

É muito triste isso acontecer de forma tão reacionária.

As pessoas têm o direito de não gostar e criticar obras de arte. As pessoas não são obrigadas a apoiar mostras ou eventos artísticos que não correspondem seus aos padrões morais, culturais ou que fogem do conceito de como definem o belo, mas proibir ou coibir a manifestação da poética artística não é só reacionário. É perigoso!

É autoritarismo!

Em todos esses anos de convivência com o mundo da arte, nas diversas viagens pelo mundo afora visitando museus, minha experiência na área de cultura no governo do Paraná, meus estudos na Escola de Música e Belas Artes do Paraná, na Università della Sapienza em Roma, me preocupa uma atitude como essa.

Nesse giro convivendo com a arte contemporânea já vi obras, cujo conceito abordavam temas polêmicos e com imagens muito fortes ou até iguais aos expostos na Queermuseu, nas inúmeras bienais e em anos consecutivos que visitei, São Paulo, Veneza, Curitiba.

IMG_3157Fosse por isso, num momento como esse no Brasil, o pavilhão da Rússia, por exemplo, seria fechado na Bienal de Veneza por agredir a imagem de Cristo.

Jonathas Andrade, na Bienal de São Paulo, 2016, não poderia expor sua obra, um vídeo instalação, O Peixe, pelo olhar de algumas pessoas fere princípios ambientais. A obra faz uma relação entre o algoz e a vítima. Ele acaricia o peixe até o seu último suspiro depois que é capturado.

O vídeo foi mostrado em minha página no Youtube e uma americana insistentemente registrou sua indignação. Ela não aceitava a divulgação e em tom ameaçador disse que não era arte, mas um abuso. Bem, a liberdade de se expressar era dela.

Enfim, não retirei o vídeo da minha página.

Muitas vezes o belo, que não é o bonito, não é igual para todos.

Bonito pode ser aquele quadro que compõe uma saleta de café própria para reunir amigas é falar sobre amenidades. Mas beleza é algo mais intenso.

 “A beleza vem da emoção que temos diante de uma obra de arte quando percebemos o que o artista tenta transmitir. A beleza vem também da sensação de conseguirmos ver o mundo da maneira que pensamos ter sido a intenção do artista”. Cristina Costa.

 

 

 

 

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Vindimando. Série WWOOF

Chegou finalmente o dia que eu estava esperando há muito tempo: a vindima, em outras palavras, a colheita da uva.
A experiência da colheita na Grange du Bouys foi um ato de amor e trabalho coletivo tendo como cenário inicial o sol nascendo no horizonte.

E posso dizer com toda certeza que não tem coisa melhor para fazer aqui no programa que ajudar a coletar uvas nessa época do ano. Esperava por esse momento desde maio, quando me inscrevi para participar do WWOOF, e elegi setembro porque sabia que a maioria das colheitas aqui na Europa se faziam nesse mês.

21624129_10155006566935829_1473238807_nInfelizmente, este ano tivemos um tempo peculiar e a vindima adiantou-se por algumas semanas. Muitas uvas como a Vermentino, a Grenache e a Cinsault foram colhidas na última semana de agosto quando eu ainda não tinha chegado ao projeto. E quando cheguei na primeira semana de setembro, numa sexta-feira, disseram que só faltava a colheita da Carignan e que pretendiam fazer primeiramente na quarta feira.

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Mais tarde Stephane finalmente nos disse que íamos fazer na sexta-feira, que foi quando conseguiu juntar o maior número de pessoas para ajudar. Stephane e Florence têm amigos por toda a região que lhes ajudam no dia da colheita. É curioso ver que todos estavam aqui as 6:45 da manhã na porta da Adega, prontos para organizar o trabalho.

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Muitos deles também são produtores locais e admiravelmente com idades muito avançadas. Os pais de Sthephane também estavam ajudando na colheita.

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Da gosto de ver gente entre seus 70 e 80 anos com tanta vitalidade. Acho que eles eram os que colhiam as uvas mais rapidamente. Fomos para o parreiral ainda de noite e tivemos a oportunidade de ver o sol nascer no meio do campo.

Nos juntávamos em grupo de duas pessoas e cada um ia fazendo cada lado da parreira. Era incrível como cada raio de sol iluminava as parreiras e as uvas.

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Uma luz diferente dos raios solares provocavam composições mágicas

Era uma dessas composições mágicas fotográficas que juntam todos os elementos necessários para tirar a foto perfeita. Cada raio proporcionava uma luz diferente para cada folha. Cada detalhe, cada momento que eu estava vivendo tentava capturar com o fundo da minha alma porque sabia que mais tarde teria que traduzir meu sentimento em palavras.

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Palavras que agora custam ser encontradas para transmitir esse encontro de emoções que vivi enquanto trabalhava. Era um sentimento de plenitude, capaz de preencher um ser. Chegava a conversar com as uvas, a tratá-las como se fossem parte intrínseca de mim mesma.

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Dina, Tristan e Alex se encarregavam de levar as caixas enquanto colhíamos. Cada um de nós tínhamos um cesto em que cabiam cerca de 5/10 kg de uvas, mas depois tínhamos que colocar nas caixas que estavam dispostas no centro de cada parreiral para que eles transportassem o mais rápido possível à Adega e não deixassem que a uva começasse a fermentar ali mesmo.

Fiz três pares diferentes durante a jornada. E cada um tinha a sua forma de trabalhar. As 11 horas da manhã fizemos nosso break para tomar um café, comer um pouco e continuar o trabalho. Florence fez um maravilhoso bolo de chocolate que todos queriam a receita.

Uma pausa

Também tínhamos uma variedade de queijos franceses e café com leite para todos. Foi revigorante. O sol já começava a pegar e tínhamos ainda duas horas para continuar. Geralmente Stephane escolhe fazer a vindima entre as 7h e 13h, quando o sol ainda não está alto, aqui na França, para que as uvas não fossem afetadas pelo calor e nem as pessoas.

Nesse preciso dia fazia um temperatura ideal, mas imagino que outros dias de agosto o sol deveria pegar forte. As 10h já estava com proteção solar 50, chapéu e óculos escuros. E ainda assim me queimei um pouco. As uvas estavam em perfeito estado, resultado de um ano de amor e dedicação.

Trabalho duro e dedicado

Todos sabíamos que o que estávamos fazendo ali, toda a colheita era o resultado de um ano de trabalho duro e dedicado. As uvas da casta Carignan são de uma variedade bem doce, que eu diria que podíamos até comer em casa sem saber que é uma variedade para fazer vinhos.

Quanto mais açúcar, mais graduação alcoólica vai ter o vinho na hora de fazer a fermentação. Colhemos as uvas de uma parcela em que as parreiras tinham 60 anos de antiguidade. Isso se traduz em melhor qualidade de uvas, ou seja, que quanto mais antiga uma parreira, se bem cuidada, obviamente, produzem melhores uvas.

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As vinhas velhas produzem os melhores vinhos

As parreiras novas tendem a produzir mais uvas e distribuir as suas propriedades e aromas entre elas.

Quanto mais antiga uma parreira, menos uvas ela produz, porém mais concentração de propriedade e aromas se encontram em cada agrupamento. Por isso muitas garrafas de vinho, quando vendidas tem especificado na sua etiqueta a frase “vinhas velhas” -é uma forma de dizer que as uvas que foram feitas esse vinho tem uma maior quantidade de propriedades e aromas.

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A jornada foi estupenda!

Nesse dia me sentia como se pudesse fazer esse trabalho por anos. Cada grupo de parreiral parecia que falava por si mesmo o muito que foi cuidado durante o ano.

Era como se fosse o trabalho de um poeta: estava colhendo palavras para depois transformá-las em poesia.

Eu colhia uvas que seriam depois transformadas nesse maravilhoso líquido que se encontra dentro da garrafa: o vinho.

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É curioso ver como o trabalho de tantas pessoas se podem encontrar dentro dela. Não era só a minha mão e a minha experiência, mas sim de toda uma gente que ano após ano as colhem, as transportam, as prensam, as provam, até que um dia decidem que essa bebida, essa experiência está pronta para ser compartida.

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Depois da colheita, tivemos um almoço com todos os amigos do casal que vieram para ajudar. Nesse almoço Stephane serviu o vinho da mesma variedade de uva que colhemos, só que nesse caso, colheita do ano anterior. Ali tive contato com gente muito interessante: muitos deles, pequenos produtores de vinhos locais, outros apenas amigos do casal e que se dedicam a algo do setor, etc.

Uma garrafa de vinho como presente

A cada um deles, Stephane os presenteava com uma garrafa de vinho em agradecimento pela ajuda. Não fomos capaz de terminar com toda a colheita na sexta, o que significava que no sábado tínhamos que trabalhar de novo e terminar com a colheita. O trabalho terminava para os amigos de Stephane e Florence, mas continuava para nós.

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Não só no sábado, mas sexta de tarde também com o transporte da uva até a Adega e a limpeza de tudo.

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Ajudamos a transportar as caixas, limpá-las, separamos as uvas dos bagos e colocamos na prensa para que sejam prensadas levemente. Foram no total quase 12 horas de trabalho e sabíamos que sábado tínhamos que terminar com a colheita.

Foi super divertido e a verdade é que não fiquei cansada nenhum minuto. Era o que eu estava esperando: parecia uma criança num parque de atrações. Queria fazer tudo. Aparte dessa experiência, Stephane também conseguiu um cliente.

Que melhor história que pode ter garrafas de vinhos feitas com as uvas que você mesma colheu.

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Amassar uvas com os pés

Mais tarde, Stephane separou duas caixas de uvas para que pudéssemos amassá-las com os pés, só pra ter a experiência de sentir como o vinho era feito antigamente. Ao pisar tínhamos que separar as uvas dos bagos e fazer o trabalho não só de prensa mas também de separação. Foi super divertido.

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Foi um dia pra ficar marcado e espero poder fazer isso durante muito tempo. Porque a vindima, ao contrário do que as pessoas falam não é tão dura. É certo que tem que estar preparado fisicamente e com os músculos das costas muito fortalecidos para não sentir dor, mas é um trabalho recompensador.

Ali sentia a verdadeira história de cada produtor de vinho, de cada agricultor; ali senti a historia que cada garrafa que abro e me quer contar. A história de o trabalho de muitas pessoas, do amor de muitas pessoas, e da dedicação que colocaram para que esta bebida tão maravilhosa, que consideramos sagrada, chegasse a nossa mesa para ser compartilhada.

Um vinho nunca é aberto sem uma boa razão, seja com os nossos amigos, com os nossos amores, com a nossa família ou com quem quer que seja.

Hoje vejo que ao comprar uma garrafa de vinho, ao escolher o dia e o momento para compartir, estamos juntando duas histórias: a das muitas pessoas que trabalharam para que ela chegasse a sua mesa; e a sua, a que você esta compartilhando no momento em que voce “descorcha” uma garrafa, seja com alguém especial ou com você mesmo.

In vino veritas.
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Lições para construir um mundo melhor. Série WWOOF

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A construção de um mundo melhor começa primeiro dentro de nós mesmos. No meu caso, WWOOF é um dos caminhos.

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Acho que todo mundo já sabe que durante esse período de férias (setembro) estou imersa no programa WWOOF, que me ensina técnicas de agricultura biologica e biodinâmica. A minha proposta é mostrar, sobretudo, como é a vida no campo aqui na Europa.

Faz poucos dias que comecei o programa e já tenho uma ideia bastante ampla sobre a importância de como fazer e de como preservar nosso ecossistema. Estou no sul da França participando desse programa porque sou uma apaixonada pela viticultura e gostaria de saber mais e mais sobre todo o processo sobre como fazer um vinho, da poda até a garrafa.

Agricultura biológica

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No entanto onde estou também têm plantações de verduras, horta, azeitonas e muitas outras coisas que no dia-a-dia vamos aprendendo sobre os principais cuidados. Faz exatamente três dias que comecei o projeto, fora sábado e domingo que geralmente não trabalhamos, e já tenho a experiência de como cultivar algo que será apreciado por outros mais tarde.

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Começamos com a colheita da azeitona; que deve ser feita de uma a uma do pé de oliveira e ser seleccionada com critério, já que a maioria delas têm picadas de insetos e não podem ser comercializadas. Como se trata de um rancho biologico, as técnicas são bastante rudimentares para prevenir o ataque de insetos, o que faz ter muita perda na grande maioria no processo.

Por outro lado, comecei a olhar para aquele minúsculo fruto e apreciar-lo de outra forma. Não sei se com palavras consigo descrever essa sensação, mas trabalhar aqui proporciona um olhar completamente diferente a tudo que você tem no prato e, sendo orgânico, o valor daquilo se multiplica por mil. Isso porque só agora eu sei do cuidado diário que se tem com cada peça que é plantada.

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Já trabalhamos com as azeitonas, com a horta e também na construção de um muro de pedras feitos sem cimento, só com a força da gravidade – a taipa.

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O trabalho é duro mas também enriquecedor. Você sabe que esse muro estará ali nos próximos 30 anos e quem sabe um dia você poderá mostrar a alguém o muro construído por você e pelos seus amigos. Tudo aqui tem sido uma experiência, tudo aqui tem sido maravilhoso!

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Somos uma grupo de seis pessoas. Cada um de nós vêm de uma parte diferente do mundo: uma japonesa, uma norueguesa, um alemão, uma brasileira (eu) e dois americanos. E o mais interessante é que a maioria deles trabalham, estudam ou têm outros projetos e buscaram em seu tempo livre um espaço para embarcar nessa aventura.

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Noto a vontade que as pessoas têm de construir e preservar e o entusiasmo em cada tarefa e desafio que nos colocam. Ainda tenho muito dias pela frente, mas nesses poucos dias já experimentados não sou capaz de juntar todas as experiências que temos vivido.

Um mundo melhor para as gerações futuras

São muitas coisas pra contar e ainda tenho muito que aprender. Certamente nunca me esquecerei do meu tempo aqui. Sinto que nesses poucos dias aprendemos lições para construir um mundo melhor.

Se cada um de nós for capaz de levar isso como uma lição de vida para um dia colocar em prática e ensinar aos outros o que estamos aprendendo sobre agricultura ecológica, preservar o meio ambiente, o ecossistema e também nossa tarefa diária de dividir e compartilhar, acho que vamos com certeza deixar nossa marca para construir um mundo melhor para as gerações futuras!

La Grange du Bouys

WWOOF: Um projeto de vida

WWOOF!  Oportunidades Mundiais em Agricultura Biológica é uma rede de trabalho voluntário em fazendas ecológicas. É o modo de lutar contra a contaminação alimentar  com o jeitinho da paz, sem guerra.

A partir daqui vou começar a dividir com vocês as férias mais fantásticas que desfrutei até agora. WWOOF:Um projeto de vida.

Deveria estar escrevendo esse post assim que cheguei ao projeto, mas infelizmente não foi possível. A velocidade com que as coisas acontecem aqui, faz com que você queira escrever o tempo todo. Mas não dá para fazer tudo ao mesmo tempo. Se você se entrega à inspiração de contar a experiência, acaba perdendo momentos que você realmente não quer perder.

Início

Então vamos pelo começo: saí de Madrid no primeiro dia de setembro, às 13:30  rumo a Beziers, na França, para começar as minhas férias. Férias realmente não é, porque me meti num programa de intercâmbio para aprender técnicas de agricultura ecológica, justamente numa vinícola com esse objetivo, para ver como é o processo do vinho ecológico.

Durante meses pensei nesse projeto e muita gente tentou me dissuadir dos meus planos, falando que a vida no campo era super complicada e que ia morrer fazendo esse tipo de trabalho. Nada e ninguém conseguiu mudar o meu projeto.

Estava realmente animada com o tema e mesmo escutando as mais diversas opiniões, fiz minha cabeça e fui adiante com o projeto WWOOF; agora que estou aqui posso dizer com toda certeza que essa é uma das melhores coisas que fiz na minha vida.

No trem sentei ao lado de um senhor argentino que estava a caminho de Montepellier para investigar sobre a sociedade do campo. Era engenheiro agrônomo que dava aula na Universidad de la Plata. Ele e a sua mulher conheciam o Brasil super bem e me contavam sobre suas andanças no meu país natal.

Amizade

Depois de 30 minutos de papo, já conversávamos como se fossemos amigos da vida toda. Tive a certeza disso quando ele, no meio do trem, preparou um chimarrão pra gente ir conversando. Minhas férias apenas começavam e já estava desfrutando de cada segundo.

Cheguei em Bezier às 7:20 para encontrar a Florence, uma das proprietárias da vinícola junto com o seu marido Stephane. Foi minha primeira interação em francês e me surpreendi no muito que entendia quando ela falava.

Me disse que tínhamos que esperar ate às 20:30 porque também estava a caminho uma japonesa que vinha direto do Japão para participar do projeto WWOOF. Tudo parecia genial. Florence é um encanto e tudo que contava parecia mais e mais encantador.

Ela me avisou que antes de ir a Vinícola que íamos a essa cidadezinha chamada Pezenes, que todas as sextas-feiras durante o verão tem esse feira do vinho em que os produtores locais montam stands no centro da cidade para mostrar o seu produto e dar chance aos locais de conhecerem melhor o seu vinho.

Degustação

Eu estava alucinando: estava na França, de férias e começando todo meu projeto com uma degustação de vinhos!

Ali conheci a os outros WWOOFers do programa: uma casal de americanos, uma norueguesa e um alemão. Todos vivendo na mesma casa e super motivados com tudo o que eles estavam aprendendo aqui. É incrível ver como todo um mundo se abre diante dos seus olhos: de repente todo seu entorno fala a mesma língua que você… todos amam o vinho, todos estão aqui porque têm inquietude que a vida profissional e pessoal não pode sanar,todos estavam aqui buscando não só aprender um ofício a mais, mas sim de viver uma experiência.

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Vista do meu quarto
 Todos queriam novos horizontes

Os casal de americanos trabalhava com marketing em Paris e também deixara o trabalho para se aventurar em algo novo: o alemão pediu um break do seu doutorado e veio de carro à França parando nas diversas fazendas e trabalhando como woofer – era a segunda vez que ele estava nessa Adega; a norueguesa veio aqui para aprender francês e encontrou no projeto um meio barato para aprender a língua; e a japonesa veio fugindo da Austrália, onde viveu por 18 anos, buscando uma mudança radical de vida.

Todos com passados diferentes, todos com historias diferentes, mas todos com as mesmas inquietudes em um gosto em comum: o vinho, a agricultura, o terroir.

Tudo era tao perfeito que já estava satisfeita de conhecer esse gente tão maravilhosa na minha frente. Quando as coisas não precisavam melhorar, a verdade é que superou todas as expectativas. Chegamos a Vinicola meia-noite, e Florence apresentou a casa que eles tinham separadas para os WWOFers.

Nossa Morada

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Era uma casa de sonhos, como essas casas francesas típicas da Provence que vemos nos filmes, com cinco quartos, decoração rústica francesa com toques ‘clean’, uma cozinha com tudo que você pode imaginar, jardim com mesas pra comer fora, horta com verduras, frutas e legumes.

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Florence se preocupa em comprar comida BIO para todos nós e deixa um carro a nossa disposição para irmos à cidade mais próxima quando é preciso, ou ir à praia ou onde a gente quiser. Isso é surreal. Se as pessoas conhecessem esse tipo de vida quem sabe as multinacionais estavam falidas porque aqui se reúne a “cremme de la cremme” (máximo, o super, do melhor) do mercado laboral: gente com, realmente, vontade de trabalhar e paixão pelo que faz.

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Esse é apenas meu primeiro dia, mas hoje tenho completa certeza de que isso vai ser uma experiência para ser recordada muitos anos da minha vida.

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meu quarto
meu quarto

Todas essas pessoas estão trabalhando poucas horas por dias em troca de casa e comida… quando você vê tudo isso que Florence e Stephane construíram, você realmente começa a colocar o dinheiro em segundo plano de tudo.

Não que ele não seja importante, mas como dizia Victor Hugo, devemos lembrar quem é o dono de quem.

Florence e Stephane são um casal que antes trabalhavam no setor bancário por anos, e viveram em vários países diferentes. Um dia se cansaram do que faziam e decidiram se dedicar de corpo e alma ao mundo do vinho. Tomaram o negócio tão a sério que Stephane foi fazer um master na Borgonha, onde procedem os melhores vinhos do mundo, para aprender toda a técnica do começo ao fim.

La Grange du Bouys

La Grange du Bouys é o resultado do seu trabalho dedicado e do amor que colocaram nesse lugar. Todos os cantos da Adega emanam amor e isso é o mais maravilhoso de ver. São pessoas extremamente dadas às relações interpessoais e capazes de fazer amigos com o olhar.

Essa paz e amor pelas vinhas, pelas parreiras é o que eu busquei nesse projeto. E apesar das minhas altas expectativas, posso ver que desde o momento que vi Florence na estação de trem de Bezier que não ia me arrepender nenhum minuto do que eu estou fazendo.

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Muitos aqui já estão desde a semana passada; Reiko, Alex e eu acabamos de chegar e não vemos a hora de começar com o trabalho. Tudo é aprendizado e tudo parece ser tão fascinante que é capaz que eu não volte mais!

Aqui começa uma nova história de todos nós. E nosso esforço ajudará a continuar com a historia que Florence e Stephane estão construindo. Começamos já!

Era uma vez…