Foto by Janine Malanski

Humor inteligente na instalação de João Osorio não perde a atualidade

É inegável que a crítica feita pelo artista paranaense João Osorio Brzezinski em 1999, na obra 'Os Três Poderes enquanto o Brasil Implode' não perdeu a atualidade. Infelizmente!

Apenas mudam os personagens na política brasileira. “Eles dormindo e povo se matando”, diz o artista, que também conta que a obra foi recusada pelo Salão Paranaense da época. 

 O Executivo, Legislativo e Judiciário estão deitados em três colchões, cobertos com tecidos de estampas idênticas, porém de cores diferentes. O colchão do meio dorme o então Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso,  fazendo o mesmo sinal de Cristo indicando o caminho, de um lado Antonio Carlos Magalhães, presidente do Senado, num sono descontraído e relaxado e de outro Carlos Velloso, do Supremo Tribunal Federal, com medo dos dois.

Para quem mora em Curitiba ou deseja conhecer a cidade, que já não é tão ecológica, deve dar uma passadinha no Museu Guido Viaro, ali perto da Reitoria para conferir as obras de  Brzezinski na mostra ‘Os inéditos e já esquecidos’ . Pelo título é possível perceber a forte  característica da personalidade do artista, de temperar com uma pitada de humor inteligente, mas um tanto ácido, as suas criações. A mostra ficará aberta ao público até 21 de janeiro.  

A exposição faz um giro na trajetória de vida de João Osorio que celebra os seus 80 anos com muita energia criativa e ainda com vontade de polemizar.  A sua juventude viveu em plena ditadura militar e como aluno do pintor Theodoro de Bona mostrou ao seu renomado professor que sua poética artística não se fixaria na arte acadêmica,. “Ele queria um outro caminho, próprio a seu tempo e ao seu espaço, no seu mundo contemporâneo, provocativo e com uma imensa necessidade de pesquisa”, relata o crítico de arte Fernando Bini. 

Sol Minguante – Acrílico sobre tela/2021. Brzezinski coloca em pauta a questão ambiental e faz críticas irônicas à sua moda.

Em Paisagem – Ecoline sobre Papel/1961 ainda aluno da Escola de Belas Artes do Paraná, início de sua trajetória artística, começa a mostrar a sua inclinação em desenvolver trabalhos mais conceituais. Certamente, grandes nomes da pintura foram seus inspiradores como Cézanne e outros que fizeram história na arte ao reinventar e abrir novos paradigmas para pintura no século  XX.

‘Os inéditos e já esquecidos’ podem ser únicos, porém esquecidos jamais,  mesmo que realizadas há décadas. Brzezinski prova o que PanHoramArte sempre defende: artistas são visionários e testemunhos de uma época.

A beleza e a perspectiva da obra O Vício – Acrílica sobre tela/2002 é um exemplo significativo do seu talento como pintor e de sua linguagem conceitual que obriga o observador a fazer profundas reflexões.

“Além de comemorarmos os seus 80 anos de vida, João Osório quando se tornou professor da Escola de Música e  Belas Artes do Paraná, substituiu o professor Guido Viaro, que lembramos neste mês de novembro e neste ano de 2021 os seus 50 anos de falecimento. Esta mostra lembra também os 150 anos da imigração polonesa em Curitiba que são as homenagens que faz o ‘polaco’João. ” Texto Fernando Bini

Sentinico – colagem /2021 figura entre as criações mais atuais de Brzezinski. “É a árvore raquítica sendo oprimida pelo bloco de concreto”, aponta ele para a instalação que reina no meio do espaço da mostra no mais absoluto martírio.

A foto e a instalação são a visão surreal do futuro. Surpreendente!

O concreto vencendo a natureza e o homem sem poder respirar livremente. 

Máscara, concreto e pouco verde.  Só nas tintas e na memória dos artistas!

Obras de arte roubadas pelo poder colonial, museus e restituições

Uma ânfora de ouro devolvida a região de Anatolia, na Turquia, por um museu de Londres, textos milenares antigos foram entregues pelo EUA ao Iraque....

E assim vai a lista  extensa de bens culturais retirados dos países de origem ilegalmente pelo poder colonizador.  Uma matéria muito interessante no ArtTribune italiano. Uma matéria de Giulia Giaume

Quem já visitou o Louvre ou o Museu Britânico sabe do que estamos falando. Certamente que grande parte estão devidamente legalizadas, mas o roubo de obras de arte em época de autoritarismo e opressão é inevitável e difícil de resolver.

O Victoria & Albert Museum de Londres acaba de devolver à Turquia uma antiga jarra de ouro da Anatólia. Datado de mais de 4 mil anos atrás, é provavelmente um artefato feito como um presente funerário. A jarra havia entrado na coleção do museu britânico como um legado de Arthur Gilbert, um colecionador e empresário imobiliário que a adquiriu por cerca de US $ 250.000 do comerciante de Los Angeles Bruce McNall, recentemente conhecido pela acusação de comércio ilegal de antiguidades. Fonte: ArtTribune

Eis o texto na íntegra em português:

Quantas vezes somos informados sobre obras de arte roubadas do Ocidente na era colonial?
Um dos monólitos sagrados da Ilha de Páscoa, nunca devolvido ao Chile pelo Museu Britânico, os mármores do Partenon levados por Lord Elgin, ainda não retornaram à Grécia novamente pelo Museu Britânico (que possui mais de 70.000 artefatos africanos e está mais inclinado a emprestá-los aos que são os verdadeiros proprietários), mas também centenas de obras de arte roubadas da Itália durante a espoliação napoleônica entre o final do século XVIII e a primeira metade do século XIX – que alguns definem os maiores movimentos artísticos da história – ainda hoje permanecem em território francês. Apesar disso, houve alguns progressos: desde a segunda metade do século XX, o tráfico ilícito de bens culturais e a sua devolução (se retirado indevidamente) foram regulamentados por várias convenções, infelizmente não retroativas, como a de Haia de 1954, sobre a taxa durante as guerras, a da UNESCO em 1970, para proibir e prevenir a importação, exportação e transferência ilegal de bens culturais, e a UNIDROIT, de 1995, sobre bens culturais roubados ou exportados ilegalmente. Aqui estão alguns exemplos de sucesso de retorno no campo artístico, para manter o otimismo enquanto aguarda os próximos passos à frente”. Texto: Giulia  Giuame.

Uma tabuinha contendo parte do Ciclo Épico de Gilgamesh, o lendário rei de Uruk – considerado o primeiro texto literário da humanidade e o segundo documento religioso do mundo depois dos Textos das Pirâmides – foi devolvida em setembro de 2021 dos Estados Unidos para o Iraque., de onde foi tirado junto com 17 mil outros achados preciosos. A tábua devolvida – medindo 15 por 12 centímetros – é chamada de “sonho de Gilgamesh”, que diz respeito a um trecho do poema em que o protagonista conta à mãe sobre seus sonhos noturnos. Ele desapareceu em 2003 e foi vendido dez anos depois por US $ 1,7 milhão ao magnata americano David Green, que o exibiu em seu Museu da Bíblia em Washington antes de ser confiscado pelas autoridades americanas. Uma placa votiva suméria em calcário datada de 2.400 aC também retornará ao Iraque. pelo Museu Britânico.

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O vaso de flores de Jan van Huysum roubado durante a Segunda Guerra Mundial foi devolvido ao Palazzo Pitti em 2019 graças à intervenção do Itamaraty e ao apelo do diretor da Uffizi, Eike Schimdt – após anos de negociações com o governo alemão. O mesmo aconteceu com a Fundação Cerruti de Torino, que chegou a um acordo com os legítimos sucessores do quadro Madonna e o Menino de Jacopo del Sellaio, San Giovannino e dois anjos, saqueados pelos nazistas na França em 1942.

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Em 2018, o presidente francês Emmanuel Macron decidiu devolver 26 obras de arte roubadas do Benin durante a era colonial e exibidas no Musée du Quai Branly-Jacques Chirac para o estado do Benin na África Ocidental até 2021. O museu organizou recentemente uma cerimónia de despedida dos 26 objectos, em torno dos quais se construiu uma tensão precária: o Ministro da Cultura do Benin, Jean-Michel Abimbola, disse que a França não respondeu a todos os pedidos de restituição, dos quais trabalha questão são apenas uma parte, incluindo uma estátua de Ogum, deus do ferro e da guerra exibida na exposição de arte africana de 1935 no Museu de Arte Moderna de Nova York.

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O Museu Etnológico de Berlim, que depois do Museu Britânico possui a maior coleção de bronzes do Benin na Europa, ordenou a devolução de seus bronzes em 2021. O governo alemão e a Comissão Nacional Nigeriana para Museus e Monumentos assinaram um memorando estabelecendo um cronograma para a devolução de artefatos roubados do palácio real de Benin em um ataque militar britânico em 1897. O acordo abre caminho para um contrato formal. assinado até o final do ano e prevê a transferência da propriedade de cerca de 1.100 bronzes do Benin dos museus alemães para a Nigéria assim que o pavilhão projetado por Sir David Adjaye for concluído, residência temporária até a construção do Museu Edo de Arte da África Ocidental .

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Jaider Esbell- 2021. A conversa das entidades intergalacticas para decidir o futuro universal da humanidade.

Homenagem a Jaider Esbell e sua conexão com o ‘espírito do tempo’

Jaider Esbell optou em seguir caminhos em outras dimensões de luz. Enquanto viveu neste planeta potencializou sua mensagem sobre o 'espírito do tempo' por meio da arte.

Suas obras emergem sob a linguagem simbólica e encantada do indígena e sua  relação com o mundo. Como ativista e militante foi incansável nos alertas sobre a destruição do planeta. 

Eu, enquanto pesquisador –  indígena sim –  mas que busco me conectar com uma filosofia de mundo, de uma ideia global, tento trazer a questão da urgência ecológica. Isso porque em todas as esferas da tentativa de comunicação inter-global mesmo, a gente não consegue entender, como é que esses esforços e  essas tecnologias se divergem e não fazem o seu dever de casa, que é orientar. Não têm uma ‘guiança’ para a humanidade”. disse ele na Bienal dos Indígenas.

foto via site da Bienal

O artista, escritor, Jaider Esbell  indígena da etnia Macuxi, morre aos 41 anos e deixa um  vazio muito grande num momento tão carente de pessoas como ele, sensível e conectado com as causas ecológicas, direitos indígenas e saberes ancestrais.

Para Jader, mesmo contemporâneas, as expressões artísticas indígenas são uma ação de resgate. “Tudo tem espírito, por assim dizer, e nós estamos pobres nisso”, escreveu no catálogo da Bienal.

Festa na Floresta. 2018 - foto via internet

Cartas ao Velho Mundo é um livro de luxo com 400 páginas sobre a história da arte ressignificado e sobreposto com arte indígena contemporânea nas obras de Jaider Esbell. Desenhos e textos produzidos com pincel Posca.  Fonte: site do artista

“A morte dele grande símbolo de resistência”, disse o xamã Bu’ú Kennedy, do povo Tukano. “As sementes que ele ajudou semear, dando oportunidade para parentes, eles e elas vão continuar. A arte, acredito, ele foi grande espelho, exemplo que arte é caminho para levar ao conhecimento da sociedade a nossa voz, nossa cultura, através da arte.” Fonte: AmazonaReal

Raposas e Beija-Flores 2020

Se temos a  memória não perdemos.

Jaider Esbell está presente em suas obras e sua voz em defesa dos indígenas não se calará nunca.

O artista fez a lição de casa usando os recursos da tecnologia. Suas entrevistas e vídeos são ricos em conhecimento ancestral  e sensibilidade espiritual.

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Casa - Marília Diaz 2021 
Cerâmica, rocha ígnea em decomposição

Achegue-se! Visite ‘Casa’ de Marília Diaz

Aconchegue-se à Casa de Marília! Aproveite o convite e acompanhe a poética da artista sobre esse espaço tão vivenciado por nós durante a pandemia.

Casa (clique aqui e conheça) é uma mostra de arte criada a partir de objetos em cerâmica feitos pela artista, escritora e educadora paranaense Marília Diaz,  aberta ao público até domingo (31), na Galeria virtual da Maré.  A galeria é um projeto de Clauba Mendonça e André Serafim, dois jovens que uniram os recursos tecnológicos com a paixão pela arte. 

Múltipla artista, Marília (poeta, escritora, artista visual) soube explorar em sua obra, idealizada a partir de uma instalação de mesa, em cerâmica e rocha ígnea em decomposição, perturbadores significados desse espaço tão nosso que é a Casa, sobretudo o que representou no período do isolamento obrigatório.

Acolhimento, aconchego, vivências cotidianas, lugar sagrado, paz, alegria ou espaço do desassossego, intolerável…..

A pequena casa de cerâmica ( 46X24X24) agiganta-se na medida em que nos faz aprofundar em seu conceito, intensificado, obviamente, pela narração da artista no vídeo.

É por intermédio dessa meditação poética que vasculhamos nossa memória afetiva e a reinterpretamos  ou melhor damos sentido ao que é para nós a casa, o lar, a morada, a permanência, enfim o que é e foi esse espaço tão habitado  obrigatoriamente durante meses ininterruptos de pandemia

“A exposição Casa emergiu da necessidade do estar limitado a esse espaço durante a pandemia. Enquanto muitas das pessoas que eu convivo entraram em processo de depressão por não saírem, eu fiz o oposto: aproveitei para organizar muitas coisas. Ganhei prêmios com reflexões sobre a pandemia, participei de lives, fiz um site, realizei três exposições virtuais, lancei quatro livros. Me mantive muito produtiva. Como diz a minha amiga Lourdes Atié, grande educadora do Sesc: “é preciso segurar o céu e atravessar o deserto”, parafraseando um pensamento indígena.
Podia escolher ficar deprimida e reclamar, mas busquei ter uma visão crítica e estar antenada com as coisas. Li bastante nesse período……”

Marilia confessa que foi durante período de isolamento que teve a inspiração de escrever um livro sobre a sua história como artista. Uma iniciativa que resgatou a arqueologia familiar. “Isso me deu muito prazer, mas ao mesmo tempo, me deu muito trabalho”.

A inquietude não cessou mesmo limitada pelas rotinas diárias de um isolamento, principalmente o de mulher dentro de uma casa. Sem pudores e problemas, conta com certa determinação e orgulho que preencheu muito bem o seu tempo nesses dois anos. “Cuidei de minha mãe, do meu marido, cozinhei, orei e trabalhei. A casa, portanto, nasce dentro desse contexto”.

Uma instalação feita fora de seu ateliê localizado em Curitiba. Devido a pandemia foi necessário ficar perto de sua mãe no interior do Paraná. Mesmo assim o resultado da obra foi aquilo que exatamente ela buscava.

Uma certa monotonia na paisagem. Perfeito. “Era o que eu queria como obra, Casa assemelhada ao branco, um pouco suja, com várias paisagens monótonas”, define ela. “Uma visão muito feminina dessa introspectiva e desse tempo que estivemos dentro da casa”

Com ideias fervilhando na mente e novos projetos, Marilia confessa que não é apaixonada pela tecnologia. No entanto, como professora universitária tem o entendimento da importância do seu uso e vai buscar apoio de quem sabe. A mostra Casa é prova dessa conexão que ela faz com a atualidade.

Com um currículo fora do comum, para essa professora, artista e escritora, uma página seria pouco para apresentá-la ao leitor. Como diz ela “tenho 66 anos e já fiz muita coisa nesse percurso”.

Na sua vida profissional transitou em todas as frentes – artes visuais, pesquisa, educação, trabalhos de cunho social, todas vinculadas a arte como meio de transformação.

Vale visitar o seu site e conhecer Marília Diaz um pouco mais

“Sou artista visual e já participei de exposições individuais, em dupla e coletivas. Me expresso principalmente por meio da argila e do bordado e discorro sobre o feminino e questões que perpassam a vida das mulheres. Tenho predileção por vasculhar, escavar arcadas, mercados populares e bazares em busca de objetos insólitos.

Conquistei pessoas que me habitam. Na Comunidade do Pinto, construí a primeira Ludoteca do Paraná, ajudei a erigir um atelier de cerâmica a partir de ruínas, congreguei 1.500 alunos e professores a construírem um mural de cerâmica em uma Escola Pública. Convidei e seduzi 84 artistas a fazerem um jardim com flores brancas em cerâmica e 86 a edificarem cadeiras com o mesmo objetivo, nos jardins de um dos museus mais importantes de Curitiba e da América Latina. Vi o homem pisar na lua, a quebra do muro de Berlim e atravesso o tempo da peste. Recontar a própria história é corporificar narrativas, trazer luz aos meus trajetos, assenhorear-me de mim mesma”. Fonte site da artista.

Fotos da Casa: Rodrigo Ramirez

O artista sempre visionário testemunha seu tempo. Aflora a sensibilidade do observador e o estimula a pensar, reagir, transformar. O isolamento social, consequência da pandemia, produziu ‘Casa’ de Marília Diaz. Uma poética individual que representa o coletivo. Uma humanidade em espera que espia o mundo pela janela aberta….