Ilustração: Ana Matsusaki

As pequenas virtudes

Quem me conhece bem, mas bem mesmo, sabe que eu gosto de me repartir. Entre amigos de todas as partes do mundo, idas e vindas, chegadas e partidas, que fizeram aprender a lidar com a gestão do tempo melhor que muita gente.

Gestiono meu tempo de forma rigorosa, sempre buscando dar o melhor de mim para a pessoa ou a atividade em questão. Sou intensa, e nessa intensidade desejo que as pessoas levem um pedacinho de mim com elas.

Meu prazer em escrever, acho que vem dai. Dessa intensidade da vida que levo com ímpeto em todas as facetas: amor, trabalho, amizade, estudos, o que for. Vivo tão intensamente que tento gravar nesse pedaço de papel, nessa folha que uma hora foi em branco, aquele momento, que de repente se tornou eterno.

Deve ser por isso que tenho diários desde os 7 anos de idade – para bem ou para mal, tive que aprender que certos momentos acabam, mas que se podem eternizar na descrição, na palavra, na poesia que tento transformar o momento em historia.

O contraponto da escrita pra mim é a leitura; que em milhões de escritores diferentes encontro meu pequeno eu dentro da personalidade de um outro. A literatura tem esse poder; de encontrar diversas vozes similares dentro da nossa própria voz… como se nesse instante você fosse entendido pelo gênio que se esconde detrás do livro e ele fosse entendido por milhões de seres humanos que compartem esse pequeno momento com ele.

Eu escrevo com tesão, como já disse no passado. E aquilo que comparto, desejo no mais profundo da minha alma que chegue a cabeça, ao coração ou a alma daqueles que leem, que conversam, que dialogam ou que compartem um momento comigo.

Traduzindo em vozes de outro, ou outra, podemos dizer que:

“Mi oficio es escribir, y yo lo conozco bien y desde hace mucho tiempo. Confío en que no se me entenderá mal: no sé nada sobre el valor de lo que puedo escribir. Sé que escribir es mi oficio. Cuando me pongo a escribir me siento extraordinariamente a gusto y me muevo en un elemento que me parece conocer extraordinariamente bien(…)” – Mi oficio – Natalia Ginzburg

Acho que faz um ano comprei esse livro da Natalia Ginzburg chamado “As Pequenas Virtudes”. Comprei-lo porque já conhecia essa escritora italiana, que me apaixonei de primeira quando numa aula de escritura criativa li o primeiro capitulo do seu outro livro “Léxico Familiar”.

“Léxico familiar” é simplesmente a historia da Natalia, contada através do léxico, do vocabulário e da expressões que marcaram a sua vida e que foram usadas pela sua família, pelo seu entorno. Todos sabemos que cada família tem a sua peculiaridade; e o engraçado desse livro é justamente a peculiaridade da família da Natalia. É relembrando fatos, historias, anedotas, frases e expressões usadas por cada membro da família, que ela recobra vida daqueles que já não estão presentes.

“Somos cinco irmãos. Vivemos em cidades diferentes, alguns de nós no exterior, e não nos escrevemos com frequência. […] Mas basta, entre nós, uma palavra. Basta uma palavra, uma frase: uma daquelas frases antigas, ouvidas e repetidas infinitas vezes, no tempo da nossa infância. […] Uma daquelas frases ou palavras faria que nos reconhecêssemos no escuro de uma gruta, entre milhões de pessoas. Aquelas frases são o nosso latim, o vocabulário dos nossos dias passados, são como os hieróglifos dos egípcios ou dos assírio-babilônicos, o testemunho de um núcleo vital que deixou de existir, mas que sobrevive em seus testos, salvos da fúria das águas, da corrosão do tempo”.  – Léxico Familiar – Natalia Ginzburg

E essa é a poesia escondida dessa escritora: através das suas experiências, lemos e nos deleitamos compartilhando esse momento único que através da sua voz se torna universal.

“As pequenas virtudes” por outro lado não é uma novela, mas sim um livro de ensaios. Ensaios sobre a sua vida, que traz a tona sentimentos dessa grande mulher que viveu a guerra, o amor, o luto, a maternidade. São ensaios curtos e longos, todos na sua justa medida, capazes de criar empatia com qualquer fase da vida de uma mulher.

O titulo do livro da nome ao seu último ensaio, quem sabe o mais potente de todos, porque aborda a educação dos filhos. É a maternidade e a paternidade juntos, dando forma e conteúdo aos nosso ato mais puro de amor: os nossos filhos.

“No que diz respeito à educação dos filhos, penso que se deva ensinar a eles não as pequenas virtudes, mas as grandes. Não a poupança, mas a generosidade e a indiferença ao dinheiro; não a prudência, mas a coragem e o desdém pelo perigo; não a astúcia, mas a franqueza e o amor à verdade; não a diplomacia, mas o amor ao próximo e a abnegação; não o desejo de sucesso, mas o desejo de ser e de saber”.  – As pequenas virtudes – Natalia Ginzburg

Natalia foi uma indicação da minha professora maravilhosa de escritura criativa Ana Esteban, que numa das aula havia lido algo dela e me fez mergulhar de cabeça na sua literatura. Viajei a Itália com o seu livro, comprei um segundo livro, chamado “Famílias” e finalmente “As Pequenas Virtudes”.

“Léxico Familiar” e “As pequenas virtudes” me tocaram tanto que copiei excertos do livro e publiquei diariamente no Facebook, tentando compartilhar aquele momento que ficou gravado em mim.

Porque estou contando isso?

Hoje, uma amiga minha de longa data, Manu, me escreveu e me proporcionou um momento de alegria, das mais singelas e ternas que tive. A sua mensagem:

“Oi, não lembro quando. Mas acho que foi você que me indicou esse livro. Faz um tempinho que comprei. Já li e reli os primeiros textos, Mas ainda não cheguei no final. Gosto de deixar aqui no trabalho e me distrair na hora do almoço quando não saio. Tão gostoso ler.”

Junto a mensagem tinha a fotografia do livro, “As pequenas virtudes”. E aí, nesse momento então eu senti: a 9000 km de distancia, a Manu tinha levado um pedacinho de mim.

Como as coincidências não acabam por aqui, entrei no Face e vi que Ana Esteban acabava de publicar outro trecho de um dos textos da Natalia, “Mi oficio”:

“Me había vuelto bastante hábil en el planteamiento de los cuentos, en despojarlos de todo lo inútil, en hacer que los detalles y las conversaciones aparecieran en el momento justo. Escribía cuentos precisos y claros, bien llevados hasta el final, sin torpezas, sin fallos de tono. Pero ocurrió que llegó un momento en que me cansé. Las caras de las personas que encontraba por la calle ya no me decían nada interesante. Estaba cansada de mirar las cosas y a la gente, y de escribirlas mentalmente. El mundo se había callado. No encontraba palabras para describirlo, no tenía palabras que me causaran gran placer. Ya no poseía nada. (…) Llevaba dentro de mí una carga de cosas embalsamadas, de caras mudas, de palabras de ceniza, de países, voces, gestos que no vibraban, que pesaban, muertos, en mi corazón.” – Mi oficio  – Natalia Ginzburg   

Assim como a Manu levou um pedaço de mim no momento que aceitou a minha indicação, eu levei um pedacinho da minha profe quando me emocionei com a leitura que ela trazia a aula. E lendo a Natalia, também me dediquei a distribuir o seu conto, alguns dos seus ensaios e parte do seu texto a amigos que tenho muito carinho e apreço.

E assim, cada um deles, cada um dos meus amigos, família, amores, vão captando, vão tendo, esse pedacinho de mim. Esse pedacinho que a gente comparte só com quem a gente gosta.

É como se fosse uma corrente do bem – a corrente do bem da literatura. A gente vai passando a diante pra espalhar esses sentimento único vivido quando passamos os olhos nas letras e deciframos parte do enigma da vida.

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Ex-libris – L’importanza di avere sua propria biblioteca

Un fine settimana di questi rovistando miei libreria ho trovato una collezione intoccabile che la ho comprato circa 12 anni fa e mai ho letto queste opere. Lì era io e il scrittore brasiliano Machado de Assis faccia a faccia, di nuovo, dopo tanti anni.

Guardavo i libri e i libri lì, avanti a me, pure guardandomi: non era il momento di aprilo di nuovo? Dopo tanti anni questi libri seguono sul mio scaffale e ora, senza l’esame temuto, senza nessuno compito a fare e senza essere costretta a leggere.

Ricordo bene il mio primo giorno all’università; la curiosità, la conoscenza e la volontà di studiare si univano  in quella classe. Dentro quelle mura di cemento, le pareti fredde del PUC (Università Cattolica del Paraná), ho iniziato a camminare verso la mia futura carriera … e ricordo ancora la voce degli insegnanti, il primo giorno, con il suo foglio di Chamex stampato con circa 20 referenze bibliografiche.

Biblioteca privata

Gli insegnanti ci hanno detto che dovevamo comprare questi libri e cominciare a costruire la nostra biblioteca privata; il nostro piccolo angolo di conoscenza, dove cerchiamo conforto quando alcune informazioni ci manca.

Per molti anni ho avuto la mia biblioteca: a Curitiba, a Londra, a Pontevedra, a Porto, a Santiago de Compostela e ora finalmente a Madrid, Spagna. Pontevedra, a Porto, a Santiago de Compostela e ora finalmente a Madrid, Spagna. In tutti questi luoghi ho dovuto fare la scelta di quello potevo portare e quello che lasciava indietro.  E purtroppo, i libri sono anche nella categoria “cose”.
L’interessante è che mai ho buttato via il esemplare di “Quincas Borba” o “Esaù e Giacobbe.” E con loro, altri che già avevo letto e sono vecchi e molto maneggiato. Ma ci sono: e ogni volta che li guardo vedo ancora il momento in cui li ho avevo letto. E in questo ricordo, comincio a ricordare anche quell’era l’età che avevo, quello che stavo facendo, i pianti, le risate, le buffonate.

Il momento giusto

Ero in mezzo a questa euforia di ricordi e nostalgia, con il mio libro”Quincas Borba” in mano, ho deciso che già era giusto il momento di leggerlo. Ho trovato sfogliando le pagine, un supplemento con domande delle diversi università di Brasile. Insomma, ho comprato al esame di laurea e dopo ho lasciato a parte.

Quindi… Era quello il momento di leggerl.Un fatto è che dopo tutto questo tempo, fino ad oggi, non aveva gettato via. E come il mio professore, Jose Carlos Fernandez, ha detto:
“i libri sullo scaffale non rimangano lì per caso, loro sono solo aspettando il momento giusto da leggo”. Credo che non dimenticherò mai le sue parole; Ho molti libri sul mio scaffale in attesa del momento giusto da leggere. E anche dopo anni e anni sono lì, in attesa ferma e forte per me.

Il mio tempo con il mio scrittore preferito è arrivato di nuovo. E voi? Chi è in attesa per voi?

Ex-Libris

Ex-libris (deriva del latino) è un’espressione che significa “dai libri di” o “libreria”. Una forma elegante e raffinata di dire questo libro è di  mia proprietà.  Qui in Spagna, molti bibliofili fanno timbri personalizzati, con lo scudo della famiglia o di un design graziosi per contrassegnare tutte le copie dalla libreria. Di solito vieni posto nel risguardo del volume o in seconda copertina.

Origine

Non si sa l’origine esatta del termine “Ex-libris”, anche se questo ha bisogno risale l’invenzione dei caratteri mobili da Gutenberg, quando i libri erano molto costoso e solo le persone con un sacco di soldi e di educazione li aveva.

Nel British Museum, per esempio, accanto a una scatola di papiro circa 1400 aC, c’è un piatto di ceramica sul quale ha detto che tali papiri appartengono alla biblioteca del faraone Amenhotep III. Nella penisola iberica, il primo ex-libris, che è stato trovato è dal re Fruela I (756-768), nel regno delle Asturie.

Nel Medioevo, troppi bibliofili nobili, mantenevano la
tradizione di dipingere lo scudo della famiglia all’inizio del volume, indicando che appartengono a loro o la famiglia.

Ma con l’emergere della stampa, nel XV secolo, che si trovano le prime indicazioni degli Ex-libris. Lo scudo non poteva più essere dipinto in libri o manoscritti e i proprietari in generale hanno scritto il suo nome sul frontespizio.

Alcuni amanti del libro hanno iniziato a utilizzare un tipo di Ex-libris fisso; altri, registrati o stampati su un unico foglio, che poi inseriva nel libro.

Il più noto, tuttavia, era ex-libris , messo all’interno del volume, sulla copertina o nel libro di versi.

“Lo studio serio e accurato di un Ex Libris rivela i gusti del suo titolare: la sua professione, le sue passioni e i suoi pregi; sono la testimonianza di cultura, di storia e amore per il libro”.

 

Capa do livro

Pan de limón con semillas de amapola

Já sei que o título está em espanhol, mas seria um crime traduzir-lhe se ainda não temos homólogo no Brasil desse livro.

Sim, esse título é o título de um livro, que na minha melhor tradução poderia dizer que se chama: Pão de limão com sementes de amapola. Em realidade, nem é um pão, mas sim um bolo.

Semana passada escrevi sobre a Feira do Livro que estava rolando em Madrid. Ela terminou domingo, no mesmo dia em que terminei de ler esse livro, e ele foi comprado nessa mesma feira do livro.

Achei o meu livro

Andando nos seus mais diversos stands, encontrei meu livro com um dos títulos mais inspiradores que vi: “Pan de limón con semillas de amapola”; e atrás dos muitos exemplares, a autora do romance.

Olhei, olhei e olhei, mas não me aproximei para não cair na tentação de comprar o primeiro livro que vi na feira. Corria o risco de voltar para casa com uns 10 títulos diferentes e pouco tempo pra ler.

Resisti à tentação e fui até o final dela. Vi muita coisa interessante, muitos outros autores mil vezes mais conhecidos autografando os seus livros.

Em cada stand escutava as pessoas à minha volta. Todo mundo dizia, conheci uma novela, um romance, um ensaio, uma crítica. Todos opinavam, todos indicavam. Ali estava eu, no meio de um parque, compartilhado com 1 milhão de pessoas, num país que não é o meu, falando uma língua que não é a minha, com os mesmos gostos, o mesmo prazer, o mesmo hobby: a 9000 km da minha cidade natal eu me sentia em casa.

E ali, sem ver o tempo passar, sem notar como ele voava no meio de tantas letras, eu ia me perdendo de stand em stand buscando títulos desconhecidos que me provocassem o mesmo sentimento que tive quando vi o livro da Cristina Campos.

E mesmo encantada com muitos deles, “Pan de limón con semillas de amapola” me venceu.

Voltei todo o recorrido, buscando o livro… e a escritora. E ali estava ela, com uma reportagem na mão sobre o seu livro, que contava que tinha sido o livro eleito pela Berlinale para fazer a sua versão em filme. Quando vi isso, não pude me conter: falei com Cristina e expliquei que uma das minhas melhores amigas trabalha no festival, também fala espanhol e já deveria estar lendo o seu livro.

Foi um bate papo gostoso, bem curto, mas com muita vontade de seguir fora dali. Levei o livro para casa com vontade de devorar-lhe naquela mesma tarde, mas antes tinha que terminar com o livro que andava já pela metade.

Esse livro conta a historia de duas irmãs que herdam uma padaria de uma pessoa completamente desconhecida na vida das duas. A partir daí Marina, a protagonista do romance, decide voltar da Etiopia, onde estava trabalhando como coperante em Medicos Sem Fronteiras, a Mallorca, cidade onde nasceu e cresceu. Ali, encontra a sua irmã, depois de 20 anos sem ver-la, e juntas começam a refazer a sua vida de uma forma completamente diferente ao que estavam acostumadas a fazer e os papéis de tinham que atuar.

Comecei a ler o livro numa segunda feira, carregando ele para todos os lados, e abrindo as suas páginas em todos os tempos livres que tinha. E a verdade é que não consegui deixá-lo até chegar o fim.

É um romance de uma simplicidade superior.

Cristina escreve com simplicidade; o lado singelo da vida que por vezes esquecemos de apreciar, e que é resgatada com os pequenos detalhes que incorpora nos inúmeros capítulos desse romance.

É um romance que recupera os valores da “vida pela vida” (em vez da arte pela arte), e o torna um imperativo em si mesmo. Nada de buscar razões, nem desculpas, nem motivos… a vida está aí para ser vivida, e devemos fazer de tudo que está em nossas mãos para isso, contra arrestando o inexorável passar do tempo.

É uma história apaixonante, que te entra pelos olhos e conquista cada vez mais com cada detalhe. Eu pessoalmente gostei mais do desenlace que do começo, mas o seu conjunto emana poesia e acima de tudo, muita leveza.

Eu recomendaria lê-lo nas férias, na frente do mar, sem ninguém ao redor incomodando e tentando compor o maravilhoso cenário de Mallorca. Dê tempo ao tempo para ler cada capitulo e deleite-se em ver o pôr do sol e fazer pequenas coisas que são grátis e que pouco aproveitamos ao nosso redor.

No finzinho da tarde, quando você voltar para casa, tente fazer uma das inúmeras receitas de pão que abrem cada capítulo do romance e dão sentido a história da protagonista.  Adicione sabor a suas linhas e coloque uma pitada de sal na sua vida. Recobre sentidos, e redescubra os teus cheiros, os teus sabores da infância.

Et voilà! A receita da vida está aí: você decide se coloca mais farinha, mais sal ou mais pimenta, tudo a gosto, claro. Afinal, como dizem aqui na Espanha: a vida é aquilo que acontece enquanto você faz planos.
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Feira do livro de Madrid – boa oportunidade para buscar aquele livro…

Está rolando a Feira do Livro em Madrid. Esse ano com Portugal como país convidado. Eu circulei por ela esses dias e como amante das letras não pude deixar de comprar livros, assistir conferências e… escrever aqui um pouco mais sobre eles: meus eternos amantes, companheiros de toda uma vida.

Amo livros, tanto como vinhos.

Bom, uma coisa não exclui a outra. Na realidade são complementares.

Feira do Livro - Madrid - Foto: Jaqueline D'Hipolito
Feira do Livro – Madrid – Foto: Jaqueline D’Hipolito

É o meu momento do dia, da noite… é quando eu me evado. Por isso as feiras dos livros são tão importantes. Mostra a uma grande parte da população o que foi lançado no mercado, da oportunidade de conhecer escritores, de conhecer autores novos e se surpreender novamente.Ali, encontramos a todos que compartem essa paixão em comum. A todos que querem ir e ver tudo que há de novo, descobrir no desconhecido e encontrar o nunca achado.

Parque do Retiro - Foto: Jaqueline D'Hipolito
Parque do Retiro – Foto: Jaqueline D’Hipolito

Acho que Madrid acertou em cheio: colocou a feira do livro bem no parque mais emblemático da cidade: o parque do Retiro. E que melhor lugar para albergar uma biblioteca ambulante, aquele no meio do parque. Você sai de casa, vai dar uma volta, vê livros, compra um, senta num banquinho e parece que você já não está mais ali, naquela cidade que impera o concreto.

Ler é como viajar sem sair do lugar.

É se auto-transportar a qualquer parte do mundo, do universo. Por isso me dedico tanto a esse esporte. Sou viajante e exploradora do mundo; quando não posso viajar, eu leio. E leio muito mesmo. Não com velocidade… mas com toda a calma do mundo, desfrutando e deleitando cada minuto de essa viagem, de esse momento.

Essa semana por exemplo terminei de ler um clássico que estava ensaiando faz anos: Anna Kareninna. Domingo passado, de tardezinha, finalmente terminei suas 1007 páginas em letra diminuta. Por um lado, agradeci não ter que levar aquela “bíblia” dentro da minha bolsa durante a semana, porque pesava um monte… por outro lado fiquei triste, como se esse livro já fosse parte de mim e agora tinha que deixar-lhe de novo na estante.

Um pequeno probleminha dos romances é que eles são finitos. Porém, o lado bom, é que agora é você que continua a história.

Bons romances são como beijos; você nunca esquece. E por anos você é capaz de lembrar grandes detalhes como se o tempo não passasse. Muitos livros que li no passado sigo lembrando hoje em dia: o enredo, o ambiente, os personagens… E, muito tempo depois, sou capaz ainda de me perguntar que faria essa pessoa (como se fosse real) em esta situação.

É como se eu ganhasse um amigo, e que ele, por muito longe que vivera, estivesse caminhando comigo na estrada da vida, ajudando-me a encontrar soluções para os problemas que surgem. Até hoje penso nos personagens de muitos livros de Milan Kundera, James Salter, Clarin, Eça de Queirós e sempre acabo perguntando-lhes coisas absurdas. Eu rio sozinha e acabo respondendo eu mesma como se fosse eles respondendo. Pode parecer tudo uma loucura, mas é aí onde eu encontro a graça da vida.

Na solidão do momento me sinto rodeada de amigos.  Com um livro parece que o tempo se congela, e só esse momento importa. É viver o presente na sua forma mais pura, é um gozo constante e uma aventura eterna.

São esses momentos, que na absurdez do meu cotidiano acabo encontrando a felicidade a tanto buscada e que cobra sentido nesse átomo de momento que chamamos vida.

Leia!

Feira do Livro de Madrid

Onde: Parque do Retiro em Madrid

Quando: 26/05 a 11/06

Mais informação: http://ferialibromadrid.com/