Muchacha en la ventana. Salvador Dalì

A importância da solidão

Acho que um dos grandes dilemas atuais do ser humano nessa época de transformação tecnológica que estamos vivendo é a solidão. É curioso pensar que vivemos numa sociedade individualista ao extremo, mas ao mesmo tempo as pessoas em geral têm uma dificuldade tremenda de encarar a solidão, de estar sozinho por opção.

Nossa sociedade atual, a de 2017, a do século XXI, tem presenciado cada vez mais pessoas que se movem numa dinâmica individualista, de certa forma egoísta, mas nunca solitária. Ou temos parceiro/a e  conciliamos nossa vida em casal com nossas atividades individuais, ou estamos solteiros/a mas temos uma vida cheia de atividades e amigos que nos permitem estar com a cabeça ocupada o tempo todo.

Solidão é vista como um problema

Querer estar sozinho muitas vezes é visto como um problema no olhar alheio; muitas vezes justificado pela falácia de que ninguém é capaz de levar uma vida sozinha. A solidão é atacada e justificada muitas vezes como um estado anti-social e anormal do ser humano. Ele quer estar sozinho, logo ele não é uma pessoa normal.

Ora, se a solidão não é ruim, por que então fugimos dela?

Agimos e pensamos de forma massificada e levamos uma vida agitada que nos impede de pensar em realmente aquilo que nos afeta. É difícil encarar a realidade, mas nascemos sozinhos e vamos morrer sozinhos. Nesse meio tempo, tentamos encher nossa agenda de forma que evitamos pensar na solidão como um fato em si.

Ou estamos com amigos, com o namorado/a, com a família, ou chegamos em casa e colocamos a TV, navegamos na internet, colocamos no Facebook, no Twitter, no Instagram fotos, curtimos as dos outros e pouco a pouco vamos artificialmente enchendo a vida das pessoas de significado.

As pessoas evitam estar sozinhas, e sozinhas me refiro, estar em casa sentados, olhando para o teto, porque isso revela o mais frágil delas. Estar em casa, na praia, no campo, sem ninguém e sem nenhum método artificial que leve a tua cabeça a outro lugar, faz você encarar quem você realmente é: com as suas alegrias, tristezas, inseguranças e medo. E fugimos disso como o diabo foge da cruz.

Encarar quem você realmente é, mais que um ato suicida, é um ato heróico. Estar sozinho é ser mais corajoso que nunca, pois faz com que você enfrente todos os seus fantasmas e mortos dentro do armário. Você começa a pensar quem você realmente é, seus traumas, momentos que te marcaram, o que te entristece, o que te alegra, e começa a encarar as tuas limitações de forma mais aberta.

Estar sozinho, de forma honesta, ajuda a um se entender melhor, analisar o que realmente busca, e como deve melhorar para chegar até ali. São nesses momentos de solidão que muita gente entende que não deveria estar trabalhando no que faz, que não quer levar o tipo de vida que leva, que gasta demais, que reclama demais, etc.

Mente vazia oficina do diabo, mente eternamente ocupada também

Nossa sociedade atual prega mais do que nunca o consumismo, o ativismo, a importância de estar ocupado. Já dizia o ditado: mente vazia oficina do diabo. O outro lado da moeda ninguém fala:  mente eternamente ocupada também. O que vai ser de você quando a solidão te atacar em cheio? O que vai ser de você quando você se deparar sozinho em alguma fase da sua vida?

Sócrates, Platão e Aristóteles sempre falaram sobre a importância da solidão para o auto entendimento. As grandes religiões da história são baseadas principalmente na solidão e na meditação. As próprias correntes atuais do pensamento pós moderno pregam a importância da solidão para o autoconhecimento. O ócio como atividade não deve ser perseguido, mas sim conciliado e pregado mais do que nunca nessa sociedade hiper-fragmentada que vivemos. Já não temos momentos de reflexão, tudo tem que ser mastigado e vomitado como se não houvesse tempo.

Hoje em dia temos cursos, e livros que falam sobre o tema da solidão sem ser esse bicho papão que assola a humanidade. A School of Life, escola em que oferece técnicas para o entendimento e aperfeiçoamento da inteligência emocional, é uma das corrente que aborda a questão, oferecendo cursos e livros sobre a questão.

Entender quem é você

Entender quem você é e as suas limitações é uma arma poderosa para encarar a vida: não só o torna mais capaz, mas também melhor pessoa.

Conheço poucas pessoas que fazem o exercício de estar sozinho; ora tiram o dia para si, para meditar, ora vão viajar sozinhos, ora sabem que devem ter momentos de introspecção para encarar algum tema, ou problema. Em vez de buscar a resposta fora, buscam dentro de si. Todas essas pessoas que conheço são pessoas equilibradas e como uma boa visão de si e do mundo.

Faz alguns anos que eu mesma busco viajar sozinha para pensar. Não que estar sozinha em casa não seja suficiente, mas sair da minha zona de conforto me põe numa situação limite para que possa ver as coisas de outra forma.

Depois de anos fazendo isso, agora começo a aproveitar e gozar da minha própria companhia. Eu não só descobri saída para problemas que estava buscando, mas também comecei a descobrir dentro de mim o que me fazia atuar de determinada forma, porque me comportava assim ou assado, e como deveria fazer para mudar.

Na busca da solidão encontrei respostas para evoluir como pessoa. Quem sabe não é isso que as pessoas precisam. Quem sabe um dia, o mundo entre um momento de catarses coletiva, levando todos a um momento de solidão e introspeção e traz esse período, essa atitude leve a sociedade a uma verdadeira revolução. “A revolução da elevação do ser” – bonito, mas utópico.

Evoluir como pessoa é um ato de solidão.

Ninguém melhor que você sabe o que se passa dentro de si, conhece os seus medos mais profundos e as suas limitações. Se olhamos verdadeiramente para o nosso entorno sabemos que vivemos uma vida baseada na mentira: mentimos no nosso trabalho, mentimos aos nossos amigos, mentimos ao nosso parceiro, mentimos aos nossos filhos, mentimos ao psicólogo e o mais grave, mentimos a nós mesmos.

Aprendemos a atuar de tal forma artificial que ninguém já fala a verdade para ninguém. Todo mundo mente. E nessa mentira entramos numa roda viva, em um estado anímico de falsidade, em que a verdade pode ser uma bomba atômica com poderes transcendentais para destruir a todos aqueles que não estão preparados para escutá-la.

Estar sozinho significa ser sincero consigo mesmo. E encarar, da forma mais nua e cruel, o que é que se passa com nós mesmos. Só assim um dia conseguiremos alçar a voz quando realmente necessitamos de ajuda: sem dramas, nem desculpas… apenas com a sinceridade e a simplicidade da palavra. Sem artifícios nem subterfúgios.

E nessa pratica, dolorosa, mas saudável, pouco a pouco conseguimos auto ajudar-nos e encarar aquilo que mais nos preocupava. Pouco a pouco vamos também descobrindo talentos escondidos, momentos importantes e aprendemos a desfrutar da companhia de um mesmo.

Como dizia Fernando Pessoa “se te é impossível viver só, nasceste escravo”.

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